"Simeão os abençoou e disse a Maria, a mãe: Este menino será causa de queda e de reerguimento para muitos em Israel. Ele será um sinal de contradição - uma espada traspassará a tua alma! - e assim serão revelados os pensamentos de muitos corações." Simeão era um homem poderoso e considerado justo, e teve a revelação divina de que não morreria sem ver o Filho do Senhor. Movido pelo Espírito Santo, foi ao templo. Tomou o menino Jesus nos braços, que fora levado ao templo para cumprir disposições da lei, e louvou a Deus, pedindo que o deixasse partir em paz, porque seus olhos viram a salvação, na pessoa daquela criança, o Ungido do Senhor Deus. E disse Simeão, o justo: - Ele será um sinal de contradição. E, ao mesmo tempo, vê nEle a luz para iluminar as nações.

Embora descendente de Davi, Jesus é de família pobre, e nasceu numa situação de pobreza, deitado numa manjedoura, sob os cuidados de José e Maria. No seu tempo, pobreza era um traço marcante de uma sociedade opressora. As suas pregações, com recorrência às parábolas para se fazer entender pelos humildes, causaram a revolta dos que detinham a riqueza patrimonial e exerciam poder político e eclesial. Valorizava os  marginalizados e combatia o legalismo imposto pelos que ditavam o rigor das regras, e exigiam que fossem cumpridas pelos desfavorecidos, conquanto não as cumprissem. Expulsou os vendilhões do templo. Chamou os fariseus de raça de víboras, sepulcros caiados. Entre o fariseu e o publicano, considerado este transgressor de todos os preceitos, ficou com a humildade do pecador, o publicano. Esteve sempre com o pecador. Exortou aos carrascos que atirassem a primeira pedra. Foi crucificado entre dois ladrões. Fez prodígios. Multiplicou pães e peixes. Alimentou com seus ensinamentos milhares de pessoas. Enfrentou com suas palavras os poderosos, em defesa do amor ao próximo. Ensinou, na alegoria da figura do bom samaritano, quem é esse próximo: o necessitado de mão estendida, a todo tempo, encontrado nas ruas, becos e casebres de nossas cidades. Curou, dizendo sempre que era a fé que dava luz ao cego e fazia o aleijado andar. Venceu a morte. Não distinguia entre o amigo e inimigo, como o fez atendendo, em Cafarnaum, o centurião, que pedia pelo servo doente. Clamava àquele que recebia a dádiva desses prodígios: - Olha, não contes nada a ninguém!
Filho de Maria, a virgem, enquanto criatura humana, mas, desde sempre, Filho do Deus vivo. Foi precedido por João, filho de Isabel, mulher idosa e estéril, e de Zacarias. Primeiro João, depois Jesus. João, o predecessor, batizava com água e exortava a todos: - Mas entre vós está alguém que vós não conheceis: aquele que vem depois de mim, e do qual eu não sou digno de desatar as correias da sandália. Eis que, no dia seguinte, João vê vindo ao seu encontro aquele do qual não é digno de desatar as correias da sandália e diz: - Eis o Cordeiro de Deus, aquele que tira o pecado do mundo.
Cumpriram-se todas as profecias.
Maria, a mãe, José, o justo, Isabel, a estéril, Zacarias, João, a voz que precede o Filho do Senhor, a voz que grita no deserto ("Endireitai o caminho para o Senhor!"), e Jesus, filho da Virgem Maria, cujo esposo José, descobrindo a gravidez, sem que tivesse havido convivência, pensou em rejeitá-la, mas, em sonho, o anjo do Senhor lhe disse: - José, Filho de Davi, não tenhas receio de receber Maria, tua esposa; o que nela foi gerado vem do Espírito Santo. Ela dará à luz um filho e tu lhe porás o nome de Jesus, pois ele vai salvar o seu povo dos seus pecados. José aceitou a explicação divina, por ser um homem justo e cheio de fé. Do mesmo modo, ocorreu com Maria, quando o anjo do Senhor entrou na sua casa, exaltando-a: - Alegra-te, cheia de graça! O Senhor está contigo! Ela encheu-se de temor. O anjo, então, lhe disse: - Não tenhas medo, Maria! Encontraste graça junto a Deus. Conceberás e darás à luz um filho, e lhe porás o nome de Jesus. Ele reinará para sempre sobre a descendência de Jacó, e o seu reino não terá fim. A resposta de Maria foi eloquente: - Eis aqui a serva do Senhor! Faça-se em mim segundo a tua palavra. Pôs-se, assim, a serva do Senhor nas mãos de Deus. E acompanhou o Filho até o momento do seu holocausto, ao sofrer o suplício da cruz, entregando Seu espírito ao Pai e perdoando a todos nós.
Desde o nascimento até a morte na cruz, Jesus representou esse sinal de contradição. Nasceu e viveu numa sociedade opressora, caracterizada pela desigualdade e injustiça, como ainda é até os nossos tempos. Muito pouco mudou. Os ricos continuam cada vez mais ricos; e os pobres mais pobres, porquanto necessitando do amparo da mão estendida, quase sempre negada. E a pobreza é a causa alimentadora dessa cruel desigualdade.
Natal, tempo forte em que se comemora o nascimento do Filho de Deus, é o momento de se pensar essa trajetória de Jesus: da manjedoura à cruz. Não basta cumprir retoricamente os mandamentos, de grande força espiritual e ética. Jesus foi severo com o jovem que lhe perguntou o que deveria fazer para ter a vida eterna. É preciso despojar-se, amar, e amar com a intensidade tal que não pode esse amor ser encontrado nas prateleiras das lojas de shoppings. Impõe-se o ato de acolhimento fraterno Sem utopia. Não é utopia. Ainda que fosse, nós somos os nossos sonhos. E o mundo, se quisermos que seja, podem ser os nossos sonhos natalinos.