- Ih! parece que o gás acabou! Apenas manifestara o seu espanto inicial. Para confirmar e não deixar dúvida, sacudiu o botijão: - Eh! o gás acabou mesmo!! Exclamou com convicção. Disse-lhe que pedisse um botijão, pois a comida recomendava urgência. O tempo da manhã esgotava-se. Pegou o telefone e fez a ligação. Daí a pouco chegava o rapaz, carregando ao braço um botijão de gás. - Olha - o senhor não sabe? - aumentou. Quanto? - Com a entrega, setenta e cinco, respondeu. A empregada: - Já paguei oitenta lá onde moro. Tentei argumentar, referindo ao que pagava anteriormente. A resposta foi apenas: - Aumentou. Bem. Restava apenas pagar, mais a gorjeta de praxe. E pensei: há alguma coisa estranha na economia brasileira. Os preços sobem e o índice inflacionário cai. Não vai demorar, ainda neste ano em que eleições serão realizadas, e passaremos a viver, paradoxalmente, um processo deflacionário, com índice negativo e preços altos. Não sei como, mas pode ser que esse fenômeno se projete em nossa economia comandada por Meirelles, Temer, Romero Jucá e o famigerado e notório deputado Marun, o das grandes negociatas no Congresso Nacional, onde a máxima franciscana do é dando que se recebe se operacionaliza com absoluta desfaçatez, sob as justificativas espúrias, para dar mais uma facada no povo brasileiro, com a aprovação do criminoso projeto de reforma da previdência.
Mas o golpista Temer, que a rede Globo, através dos seus porta-vozes de sempre, chama de presidente, embora não tenha recebido um mísero voto, sabe o que faz. Tanto que em 2017, o ano das maruadas (se Houaiss fosse vivo, maruada seria sinônimo de sem-vergonhice), foi flagrado por um gravador indiscreto, em que dizia de forma suspeita ao seu interlocutor, dando-lhe instruções para calar a boca do ex-deputado corrupto Eduardo Cunha: - Tem que manter isso, viu? (O pagamento das propinas.) E o interlocutor: - Todo mês. E haja inflação de propina e de denúncias, que Janot não deixou por menos. Mas... a turma da maruada não deixou passar.
Deixemos essa história pra lá. Vamos à inflação à brasileira. Não sei se vocês já perceberam, conforme a conversa iniciada acima, que há, de fato, algo estranho no ar ou mesmo nesta terra de Cabral. Todos os preços subiram e sobem. A não ser que o engano seja meu. Posso até compreender, e, se eu estiver enganado, dou a mão à palmatória, como diziam em priscas eras. Lá pra minha casa, a conta de energia elétrica está pelas alturas, já não é mais um agregado financeiro, representa uma família à parte. Condomínio subiu. Gêneros alimentícios, do mesmo modo. Dois meses atrás, deixei de comprar um livro em uma das nossas livrarias. O preço eram quarenta e nove e uns quebrados. Depois, resolvi comprá-lo. O preço do dia da aquisição: quase sessenta reais. Indaguei: por quê? Resposta: houve uma atualização de custos. Parodiando a Bíblia, em época remerojucaana, de muitas negociatas congressuais, em verdade vos digo: a inflação à brasileira tá pela hora da morte. Como ninguém quer morrer, vai-se levando, comendo o pão que o diabo amassou, porque o Temer está naquela da época do milagre do ditador Médici, ame-o ou deixe-o. Convenhamos: uma alternativa cruel. Difícil deixar o Brasil, e muito mais difícil amar o Brasil de Temer.
Por via das dúvidas, recorri aos economistas, para me explicar o que seja inflação. Peguei um desses livrinhos utilitários, compostos de perguntas e respostas, apropriados para ignorantes como eu em economia. Lá estava dito que a inflação ocorre quando há muita demanda e pouca oferta. Achei pouco. Não me conformei, até porque, vejam bem, estudei economia política, no curso de Direito, e o autor adotado pelo professor Perdigão era Henri Guitton. Eram quatro volumes. Se o esquecimento não me corrompe (já que estamos vivendo esse drama nacional), cada prova era um volume. E como não os tenho mais, outro autor consultado me esclareceu que a inflação pode ser definida como uma alta generalizada e persistente do nível de preços em uma economia, e aproveitou o ensejo doutrinário para se referir às escolas monetarista e estruturalista que explicam o fenômeno da inflação. Cada uma adotando concepções próprias. Coisas de economista, que, em boa parte das vezes, têm contribuído com seus planos mirabolantes para enterrar o Brasil no pântano da especulação, isso desde o Império, passando pela República velha e atualmente nos atormentando na República nova, ou na nova República, como disse Tancredo. Planos econômicos foram inúmeros. Desde o Plano de Estabilização Monetária, de 1958, até Delfim I, II e III, de 79, 81 e 83, Dornelles, de 85, Cruzado I e II, de 86, Bresser, de 87, Arroz com Feijão, de 88, Verão, de 89, Collor I e II, de 90 e 91, Marcílio, de 91, e o Plano Real, de 94. E até hoje o brasileiro discute na justiça as suas perdas. Alguns ficaram mais pobres. Sem ressentimento, porque já eram pobres. Outros, nem ricos nem pobres, foram jogados na miséria. Os ricos, ah!, estes, independentemente de plano, continuam ricos. Quem sabe todos se encontrarão um dia no paraíso, e Deus que bem-aventurou os pobres, receberá estes menos afortunados no seu reino, deixando os ricos com as suas riquezas. Enquanto isso, deixemos que os nossos economistas expliquem o fenômeno da nossa inflação, em que os preços sobem todos os dias, e o índice inflacionário cai pela lei da gravidade dos interesses daqueles que realmente ganham com essa prática estelionatária. P.S.: Muito triste ao saber do falecimento de Lamarck. Meu aluno na UFMA. Primeira turma de Imperatriz. Estagiário do meu escritório. Inteligente. Bom de papo. Um grande amigo. Minhas condolências a toda sua família.
* Membro da AML e AIL.
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