Entrei de férias. Bem merecidas, disseram-me. Acreditei nessa avaliação amiga. Fui para São Paulo, onde, entre outros entretenimentos, assisti ao musical sobre a vida e arte de Wilson Simonal. Grande espetáculo, que mostra o talento de um dos maiores showmen da música popular brasileira, tragicamente assassinado em vida pelo fanatismo de uma esquerda cruel, que lhe fechou todas as portas, freando a sua caminhada na ribalta do sucesso. Morreu no esquecimento, vitimado pelo desprezo. Tentam ressuscitá-lo. Esse belo musical tem essa finalidade. Mas o hediondo assassinato de Simonal em vida não merece perdão. Após, perambulei por São Paulo: Livraria Cultura, Martins Fontes, Saraiva, indo até Campos do Jordão, onde fiquei uns três ou quatro dias, sentindo o frio e a beleza estética dessa cidade. Pensei que a crise que assola o Brasil tivesse, como ocorreu comigo, tirado férias, pois abria os nossos jornais – os que leio: Folha de São Paulo e O Globo – e as notícias mais destacadas davam ênfase à crise: inflação, desempregado, desaquecimento da economia etc. etc. etc.

Deparei-me com a crise, de um jeito paradoxal. Uma crise, acolhedora e desanimadora, dessas que motivam e desmotivam. Sabem?! – injeta um otimismo, que declina com o noticiário ostensivo do desânimo. Joseph Goebbels afirmava com a convicção nazista que a mentira repetida mil vezes se transforma numa verdade inquestionável. O certo é que fui encontrando com a crise dos bares cheios, das lanchonetes repletas, dos restaurantes com até três horas de espera. E agora estou sabendo que temos a crise da cebola, com aumento de 150%. Pois bem. A crise com a qual me deparei, deixa a Grécia de chinelo. Sabe: era uma inflação dos diabos para todo lado. Inflação de tudo. Nem os aviões escaparam dessa inflação. Quase não se via poltrona vazia.
Por isso, o meu primeiro momento de convívio com a crise foi ao chegar ao aeroporto. Parecia mais feira livre no final do dia. E era gente mesmo! Aí pensei, ingenuamente, pode ser ilusão de ótica. Tou sonhando?, foi a pergunta que me fiz. Mas deduzi: deve ser a crise. Os aeroportos estavam tão cheios, que pareciam a famosa 25 de Março, a rua de São Paulo onde todo mundo vai para fazer a sua comprinha. Não havia um mísero lugar de sobra. Minto: parece, se não estou enganado, havia uma ou outra poltrona de quem faltou à viagem. Os passageiros, ostentando as denominadas bagagens de mão, que, dado ao desproporcional tamanho, parecia mais bagagem de mão e de pé. Aí tive o topete de pensar: é a crise! Ainda acaba com esse país.
No aeroporto de Guarulhos, outro enfrentamento da crise. Gente pra todo lado. As mesas dos restaurantes e lanchonetes repletas, parecendo festa de quinze anos. Nos caixas, a fila de alguns cansativos e enfadonhos metros. Aí voltei a pensar: que crise!, meu Deus!
No teatro, onde foi apresentado o musical sobre Simonal, os manobristas não cessavam de receber carros, e os pagamentos eram feitos antecipadamente no dinheiro ou no cartão. Bem. Tive o topete da dúvida de voltar pensar: com essa crise, o teatro deve estar pela metade. Ledo engano. Fui pessimistamente enganado nessa catastrófica previsão: o teatro estava com todos os lugares ocupados. Aí, tive a desfaçatez de pensar: aqui a crise deve ter entrado de férias. Ou alguém deve estar chorando por aí com o sumo da cebola em alta.
Confesso: não me conformei com essa avassaladora e destrutiva crise. Parti para Campos do Jordão. Lugar aprazível. Mas frio. Não a frieza da sua gente, ou da crise. A temporada era de inverno. Tinha mais veículo do que rua. Estacionamento cobrado na faixa de trinta reais, mais acréscimos. No mais, a partir da 17 horas, quase não se conseguia andar em suas ruas. Gente pra cima e pra baixo. No cair da noite, e lá anoitece cedinho, é que a confusão aumenta. Nos restaurantes e lanchonetes, os lugares são disputados, no bom sentido, a tapa. Aí, em determinado momento dessa agonia consumista, voltei a incorporar o pensamento pessimista: aqui a crise ainda é mais destrutiva. O dinheiro anda tão escasso que as pessoas estão a perambular pelas ruas, disputando um lugarzinho para descansar.
O pior dessa fenomenal crise é que, quanto mais os aviões estão lotados, empresas, como a TAM, diminuem suas operações em 10%, gerando demissão de empregados, sob a justificativa de que as medidas são para enfrentar “um contexto econômico do Brasil”. Pode até ser. Ou também pode ser incompetência gerencial. Isso sem falar da crise do sapato. Produto mais vendido no Brasil, chegando a 25 bilhões, em 2014. Ou, ainda, a crise do sonho do peito novo. As dondocas reclamam que não podem mais endividar-se para colocar prótese no peito. Ou, ainda, a crise do BRADESCO, que só neste segundo trimestre teve um lucro de R$ 4,473 bilhões – um aumento em relação ao trimestre anterior de 5,4%. Que crise, hem?!