Aureliano Neto*

Os fatos fazem a história, ou a história é que faz os fatos? Mesmo considerando essa dúvida, para que a história seja feita, os fatos são essenciais. Caso sejam relevantes ou não. Sendo, deve ser dado a eles o destaque que merecem. De tudo, uma verdade: o homem é o senhor da história. É o centro dos fatos, vetor fundamental na dinâmica de sua construção. A Inconfidência Mineira só foi inconfidência por causa dos inconfidentes, que sacrificaram a liberdade e a vida, culminando na execução de Tiradentes. De outra forma, seria um insignificante movimento já no esquecimento. A manifestação cívica das "diretas já", que mobilizou a nação inteira, em pleno regime militar, teve na figuras dos seus líderes - Ulisses Guimarães, Franco Montoro, Leonel Brizola - os condutores maiores de toda uma luta libertária, em que pese parcela expressiva da mídia virar as costas, boicotando a vontade e consciência políticas do povo brasileiro.
Essas reflexões iniciais ora expostas me levam ao passado não muito distante, em face da luta que o povo desta região vem travando - agora com ânimo mais arrefecido - para alcançar a divisão territorial e, por conseqüência, a sua emancipação política, objetivando conquistar um novo Estado, sob a denominação de Maranhão do Sul. A reivindicação é legítima. Historicamente sempre o foi. E toma ares e força de legalismo, na medida em que essa pretensão possa ser viabilizada no Congresso Nacional, para, em seguida, se concretizar através de consulta plebiscitária, a ser realizada tanto na área do processo de desmembramento quanto na que venha a sofrer a separação.
Sobre esse tema, há um silêncio tumular. Parece que a região e o seu povo adormeceram. Uma pena!
Mas, historicamente, essa reivindicação é bem velha. Lembro que, nos idos de 1977, participei, como debatedor, do I Simpósio de Redivisão Territorial, realizado no então Cine Fides. Teve à frente dessa iniciativa os vereadores Joaquim Paulo de Almeida, Freitas Filho e Edson Caldeira. Esses parlamentares foram fundamentais para que o debate sobre a redivisão territorial fosse realizado. De todos, deve ser destacada a persistência cívica de Joaquim Paulo, que se pôs no comando sacrificando o seu patrimônio político e mesmo físico.
Consulto o Diário do Congresso Nacional, ano XXXII, n.º 079, edição de 10 de agosto de 1977. Nele consta a manifestação do deputado Siqueira Campos (ARENA-GO), que aqui esteve, como convidado e participante. Liderava então a luta pela divisão do Estado de Goiás. Siqueira Campos assim se manifestou: "Realizou-se o conclave com maior brilhantismo, tendo motivado as lideranças e o povo da imensa área da qual Imperatriz e, indiscutivelmente, a Capital, para a mais ampla discussão da problemática." Enfatizou, ainda, esse parlamentar de Goiás, em seu pronunciamento no Congresso Nacional, a colaboração das lideranças locais, dos clubes de serviço Lions e Rotary, além da participação dos jornais O Fato e O Progresso. Cita o valioso apoio Carlos Gomes de Amorim, esse grande líder de Imperatriz e desta região.
Quanto à importância do Simpósio, ressaltou Siqueira Campos que "de fato, dos debates emergiu toda uma realidade social, econômica, política e cultural daquela que é uma das mais progressistas áreas novas do País". E afirmou que "evidenciou-se, sobretudo, a conscientização de que, somente através de criação de novo Estado naquela área, serão, afinal, solucionados seus agudos problemas". Refere-se a esta região, em galopante desenvolvimento econômico à época, e atualmente em franco processo de consolidação dos seus valores sociais, políticos, culturais e econômicos, acentuando que só com a redivisão territorial e a sua independência política é possível vencer grandes etapas para o seu crescimento.
Nesse I Simpósio Regional sobre a Redivisão Territorial (e único), participaram como debatedores José de Ribamar Fiquene e Frederico Almeida Rocha. Na coordenação dos trabalhos estavam Geraldo Mariano Alves, José Guimarães Filho, Mário Leonardo (então Promotor de Justiça de Imperatriz), Osvaldo Alencar Rocha, Adalpe Pedro Silva, Ozires Carrijo e este escriba que relembra os fatos ocorridos no tempo, mas que ainda não fizeram história.
O pensamento da época era criar um novo Estado, com o desmembramento de parte de Goiás e do Maranhão, sobressaindo-se Imperatriz, já considerada a capital da região tocantina, como o município mais importante desse processo de redivisão. Isso fez com que Siqueira Campos, ao concluir a sua fala, afirmasse que "mais confiante nos nossos destinos e, por isso, mais motivado para prosseguir na luta é como me sinto, ao retornar de Imperatriz, a cintilante e formosa Capital da região tocantina do Maranhão".
A mim veio o grito dessa lembrança, que a deixo como contribuição para que os fatos que fazem a história não fiquem no esquecimento. E muito menos nele fiquem sepultados os homens, como o vereador Joaquim Paulo, que teve a coragem e o desprendimento de levantar a sua voz libertária em prol da criação do Estado do Maranhão do Sul. Dizem que Joaquim era um visionário. Não creio que fosse. Com legitimidade, levantou essa bandeira, como se fosse um inconfidente incompreendido. Empunhou-a. Foi em frente, com denodo e dedicação. A história é sempre construída com muita luta. Com boa dosagem de incompreensão. Às vezes com lágrimas. Às vezes com sangue. Às vezes de atos pacíficos. Mas a luta tem sido a marca diferencial de Imperatriz e do seu povo. Talvez Joaquim estivesse certo, já que não tirou nenhuma vantagem política. Outros sim, oportunistas. Muitos deles, fraudadores desse ideal de liberdade.

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