E se esta mulher respondesse não? Como seria o rito da história? Mas, diz o evangelho que, após a explicação do anjo Gabriel, ela, a virgem prometida em casamento a um homem chamado José, ciente de que o Espírito Santo desceria sobre a sua pessoa, como escolhida por Deus, aceitou ser a mãe do Filho de Deus, a quem teria que dar o nome de Jesus, e disse, com humildade, fé e convicção: “Eis aqui a serva do Senhor! Faça-se em mim segundo a tua palavra.” Antes de concordar com a proposta do anjo enviado por Deus, os dois mantiveram um diálogo em que alguns pontos controvertidos tiveram que ser esclarecidos. Maria, sim, fala de Maria, mãe de Jesus. Quando o anjo a encontrou, foi logo exortando: “Alegra-te, cheia de graça! O Senhor está contigo!” Com essas palavras, Maria ficou assustada. Enfim, embora o noivo José, para quem estava prometida, fosse da descendência de Davi, era uma pobre mulher de uma cidade da Galileia, chamada Nazaré. O anjo Gabriel percebeu que Maria estava perturbada e lhe disse: “Não tenhas medo, Maria! Encontraste graça junto a Deus. Conceberás e darás luz a um filho e lhe porás o nome de Jesus. Ele será grande; será chamado Filho do Altíssimo, e o Senhor Deus lhe dará o trono de Davi, seu pai. Ele reinará para sempre sobre a descendência de Jacó, e o seu reino não terá fim.” Ainda em dúvida, Maria perguntou: “Como acontecerá isso, se eu não conheço homem?” O anjo deu a resposta definitiva que a convenceu da sua santificada maternidade: “O Espírito Santo descerá sobre ti, e o poder do Altíssimo te cobrirá com a sua sombra. Por isso, aquele que vai nascer será chamado santo, Filho de Deus.” Em seguida, o anjo Gabriel refere-se, como justificativa, à gravidez de Isabel, que concebeu um filho na velhice, embora sendo estéril, pois para Deus nada é impossível.
Estamos em festa, a maior festa da cristandade. Comemora-se o nascimento de Jesus, o Filho de Deus, o Deus que se fez homem, para viver entre nós e nos ensinar que o sentido da vida está no amor. Amar a Deus e amar ao próximo. Dois postulados que estabelecem o caminho a ser seguido. O filho de Maria e o Filho de Deus, Jesus, não nos deixou outra alternativa. A alternativa do amor. E Ele quis nos dizer: não adianta amar a Deus e não amar ao próximo. E o próximo está identificado na parábola do Bom Samaritano. São todas aquelas pessoas que precisam do nosso amor. Mas não o amor do abraço fraterno, como cumprimento de regra do formalismo de ocasião. E sim o amor que exige de cada um de nós gestos concretos de solidariedade, de compreensão, de carinho. O conflito, a guerra, o desentendimento, a ganância, a inveja, a vaidade, a vingança, o ódio, tudo isso decorre da ausência do amor. Os cemitérios, onde são sepultadas as vítimas de guerra, deveriam ter, no portão de entrada, a cruz e esta inscrição denunciativa: “Eu tanto que lhes pedi que se amassem uns aos outros!”
Conta-se uma história (do livro O tempo de Deus, de Aldo Colombo) que um monge, chamado Silvestre, recebeu um comunicado que dizia: - Vá para a montanha e eu estarei esperando por você na cabana. O monge partiu logo cedo. No meio do caminho, deparou-se com um ferido que pedia socorro. O monge Silvestre tinha pressa e não podia perder tempo com aquele ferido que necessitava de cuidados. Seguiu caminho. Mas, antes, explicou ao ferido que tinha um encontro marcado com Deus. Na volta, o ajudaria. Após uma longa e cansativa caminhada, o monge chegou à cabana e encontrou um aviso em letras bem legíveis: “Fui atender o ferido que você ignorou. Volto logo. Assinado: Deus.” Essa pequena história esclarece que o ato de amar exige de nós para com o próximo sacrifícios concretos. Santo Agostinho ensinava que a medida do amor é amar sem medida. E o ato de perdoar é a essência do amor. Lacordaire dizia que “se se quiser ser feliz por um instante, vingue-se; mas, se se quiser ser feliz para sempre, perdoe”.
Embora a vida seja a arte do encontro, e, mesmo assim, como afirma o poetinha Vinícius, haja tanto desencontro pela vida, este Natal nos desafia a sair de nossa zona de conforto, cercada pelo muro do individualismo estéril. É que o outro, o próximo desafia o cristão a praticar atos samaritanos que o Cristo, filho de Maria, a nazarena, nos exortou, na sua breve e revolucionária passagem entre nós. Da manjedoura à cruz, ficaram lições de amor e perdão, que, se praticadas, o mundo seria bem diferente. O ódio e a intolerância se constituem em vírus destrutivos de quem se diz ou prega o cristianismo. E a comemoração do Natal deve ser centralizada nessas duas pilastras cristãs: o amor e o perdão. Jesus demonstrou que preferia ao publicano pecador ao fariseu cumpridor de regras religiosas. Ensinou: “Este é o meu mandamento: Amai-vos uns aos outros como eu vos amo.” (Jo 15,12). Feliz Natal. E um ano de 2019 de muita fraternidade e amor.
Membro da AML e AIL.
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