De rolê em rolê já não se tem nenhuma dúvida, ainda que insignificante, vamos aos rolezinhos. De início, quando tomei conhecimento desse "movimento", não quis saber da história. Passava por cima da notícia. Não me despertava o mínimo interesse. Considerava uma trivialidade de grupos de desocupados. Longe de mim a conclusão de que os rolezinhos serviriam de matéria para estudo sociológico e jurídico. Mas, qual nada! Abri os sites jurídicos e lá encontrei várias manifestações a favor e contra, como se estivéssemos em pleno Maracanã num Fla X Flu, em que as torcidas ovacionam e vaiam os seus ídolos futebolísticos.
Antes de seguirmos adiante, é impositivo que se tenha uma idéia, mesmo que não científica, dos graves estudos sociológicos, além dos de natureza jurídica, da concepção do que seja "rolezinho" (entre aspas, mas sem resquício discriminatório, por amor de Deus). Bem. Dizem os entendidos que se trata de um encontro de jovens, marcado pela internet, que se realiza em shoppings, com a nobre finalidade "zoar, dar uns beijos, rolar umas paqueras, pegar geral e se divertir". Afirmam: - não há nenhuma idéia revolucionária, de sentido contestatório por trás desse neomovimento. O fim específico é "catar umas minas", "rever os parça (parceiros)", "dar uma tumultuada", coisas desses fundamentos difusos, com algum viés de absoluto vazio ideológico. Os participantes, jovens da classe média, se vestem a estilo, com boné, cabelo arrepiado com gel, chapinha no cabelo, short curto, sapato Melissa, tênis e outros ingredientes menos sofisticados que fazem a indumentária leve, em caso de haver necessidade de correr da polícia ou dos seguranças dos shoppings. Assim creio.
Após vários e sucessivos rolezinhos (sem aspas), já que passamos a ter ideia do que sejam, iniciaram-se os debates nacionais. As análises se projetando em suas várias colorações ideológicas, sobretudo porque alguns intrépidos juízes concederam liminares em favor dos shoppings, proibindo o movimento no seu interior. A par disso, um delegado de polícia de São Paulo, do 65º DP, ousou, em pleno momento do amplo exercício das liberdades públicas, abri um inquérito, para apurar a prática de supostos crimes de autoria dos rolezeiros. Bem, dou uma necessária parada: se se trata de rolezinhos, havendo algum delito, só pode ser praticado por rolezeiros, daí o necessário neologismo, que tem mais natureza explicativa que substantiva. Logo apareceram na crônica jurídica expressões como "nova geração", "sonho de consumo", "inconsciente coletivo", "estagnação econômica", "inadimplência pipocando" e outros quejandos, para concluir que o movimento é mais evidente porque se dá justamente em local onde as pessoas vão realizar seus desejos, e é mero sintoma dos desassossegos sociais. Sobre tal conclusão sociológica ou antropológica (sei lá!), para quem quer zoar, rolar umas paqueras, pegar geral e se divertir, antes de ser esse comportamento sintoma de desassossego social, é, em si, o próprio desassossego. Perdoem-me os eruditos ter chegado a essa drástica ilação.
Mas a coisa não fica por aí. Vai mais além. O debate sobre os rolezinhos é de uma seriedade tamanha que chegou até a polis. Os gregos devem estar se remexendo em seus túmulos. Alguém verberou do alto de sua sapiência que "os jovens que circulam pelos shoppings nos dizem que, para sermos livres, precisamos estar e agir juntos na polis. E estar juntos implica que o pressuposto da liberdade seja a igualdade, a igualdade não como aplicação de um critério abstrato de justiça, mas a justiça como constituição da liberdade". Uma mistura dos diabos, que dificilmente os rolezeiros, os mais interessados, entenderão, imaginem este pobre ignorante escriba. Confesso que a linguagem e a construção das frases se constituem num rococó de erudição tão complicado que é bem melhor entender os rolezinhos e os fundamentos das suas "idéias" (mais uma vez aspas) na simplicidade do que foi dito acima. Sofisticar é complicar ainda mais um movimento revestido de uma simplicidade tão simples, ao dar a ele um caráter erudito inexistente.
Eis o problema sem solução: os rolezinhos podem ser realizados nos shoppings centers? Resposta não unânime. Há os que afirmam, com base na Constituição Federal, que os shoppings são espaços públicos de circulação, não podendo ser impedido esse movimento no seu interior. Outros, em que pese o sonho de consumo ou a necessidade de estar e agir juntos a polis, dizem que os shoppings são empreendimentos privados, abertos ao público especificamente para compras, lazer, diversão e passeio. A Constituição, dizem, não proíbe discriminação de qualquer natureza e garante a todos o direito de reunião (art. 5.º, XVI) em locais aberto ao público, "sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente". Em contraparida, há o direito de outras pessoas, que querem fazer o seu rolê tradicional, sem sofrer qualquer espécie de incômodo. Disso tudo decorre o conflito de interesses de rolezeiros. Um analista, sem sair do muro, se manifesta: "O direito de petição, exercido pelo shopping, não pode ser desrespeitado. Nem o direito de pessoas de todas as classes sociais de entrarem em centros comerciais abertos ao público." Então, tanto faz, como tanto fez, dá no mesmo. Só resta a todos nós rolezar. Logo, estarão todos rolezando nos fóruns, tribunais (STF e STJ), nas câmaras legislativas e no Planalto, desde que, quanto ao Supremo, não atrapalhem os longos votos de nossos ministros.
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