Aureliano Neto*

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Volto ao tema. Estarrecido, tenho acompanhado a divulgação, na mídia nacional, do início dos trabalhos referentes à CPI do Cachoeira, que tem como finalidade específica e determinada apurar a relação entre o senador Demóstenes Torres, eleito pelo DEM e atualmente sem partido político, e o contraventor Carlinhos Cachoeira, com envolvimento ainda de outros políticos, além de segmentos da imprensa brasileira, neste caso, deve ser ressaltado, de forma esclarecedora, a revista VEJA. Como acentua a linguagem midiática, de modo amplo, geral e irrestrito, os grandes órgãos da imprensa brasileira têm procurado blindar a revista VEJA, em que pese o notório vínculo mantido e comprovado nos grampos com o contraventor Carlinhos Cachoeiro.
O jornal Folha de São Paulo, através dos seus colunistas, juntamente com o Estadão e a rede Globo, incluindo jornal e televisão, têm silenciado quando não combatido qualquer referência que seja feita à participação da revista VEJA nesse escabroso escândalo, procurando dar um sentido que nada tem a ver com o que os parlamentares (de diversos partidos políticos), que compõem a CPI, pretendem apurar com base em elementos probatórios colhidos pela polícia federal, cujas peças investigatórias foram encaminhadas ao Supremo Tribunal Federal e, em seguida, à Comissão Parlamentar. O espírito de corpo, para preservar a revista VEJA, é tanto, que se tenta criar uma fantasia, como se o leitor fosse um idiota, de que, como acentua a Folha de São, no Painel, publicado em 9 de maio, "o PT decidiu investir todas as suas fichas em transformar a CPI criada para apurar as relações de Carlinhos Cachoeira com autoridades de várias instâncias numa investigação sobre a imprensa". Essa asserção padece do vício da inverdade. Não há nenhuma intenção de investigar a relação escusa da imprensa brasileira com o contraventor Carlinhos Cachoeira. O que há, na verdade, é que se deram mais de duzentas ligações telefônicas, além de encontros pessoais, entre Cachoeira ou seus comparsas, e o jornalista Policarpo Jr., diretor da sucursal da revista VEJA em Brasília, não se tratando de um mero contato entre o repórter (Policarpo) e a fonte. A relação era muito mais profunda, mesmo incestuosa, indicando que Cachoeira, num vínculo escuso e criminoso com a revista, pautava o queria e era do seu interesse publicar. As três últimas edições da revista CartaCapital, n°s. 695, 696 e 697, todas do mês de maio, trazem matérias esclarecedoras a esse respeito, demonstrando, de forma cabal e irrespondível, que a revista VEJA usava, como fonte de informação, na maioria das vezes sem maior comprovação dos fatos, o que lhe era repassado por Cachoeira e, por seu turno, o contraventor pautava a revista, manipulando a publicação do que era do seu interesse em detrimento dos seus adversários e em benefício dos seus vantajosos negócios econômicos.
Uma passagem da matéria publicada pela CartaCapital é denunciadora dessa relação incestuosa entre a revista VEJA e Cachoeira: "É inegável a intimidade que o contraventor demonstra ter com o repórter de Veja, com quem almoçava regularmente, segundo o inquérito. Nas escutas feitas pela PF, o bicheiro o chama de 'Poli'. O toma lá dá cá em alguns momentos é explícito, como quando Cachoeira manda o então diretor da sucursal de Brasília da revista publicar uma nota que lhe interesse. Em um dos resumos, está escrito: 'Ele (Policarpo Júnior, da revista Veja) já chegou e pergunta onde é para publicar. Carlinhos diz que pode ser no Radar (uma das seções mais lidas das semanal) ou no on line. Diz que se for para revista, melhor ainda." Em outra passagem, o senador Demóstenes, conversando com Carlinhos Cachoeira, em vista da reportagem sobre José Dirceu, chega a se ufanar com a força das publicações, que tinham como objetivo atingir o PT e o governo, assim se manifestando, conforme consta na gravação: "Isso é bom, hein? Isso é bom que dá um tiro direto neles. Aí, né, a gente faz a CPI do PT." São fatos estarrecedores que evidenciam o uso criminoso de uma das garantias constitucionais, que é liberdade de expressão. Chega a ser vergonhoso, deve ser enfatizado. Sentimento esse que foi expressado pelo presidente da Federação dos Jornalistas, Celso Scröder, que, na matéria da CartaCapital, afirma, sem deixar dúvida: "É um momento muito vergonhoso para o jornalismo, de confusão entre o público e o privado, entre jornalismo e partido político." A VEJA que já vinha perdendo credibilidade, com esses fatos comprometedores, dá razão a Luís Fernando Veríssimo que a tirou do seu cardápio de consumo, porquanto pôs a sua linha editorial a serviço de práticas anti-éticas e mesmo de conotação delituosa.
Fácil concluir que a investigação da CPI não tem como fim a imprensa brasileira como um todo, como quer fazer crer o espírito corporativista de alguns jornais, mas investigar uma publicação que foi usada criminosamente por um infrator, para, manipulando-a, como se estivesse a servir de fonte, alcançar êxito nos seus negócios escusos. A liberdade de expressão tem como fundamento não apenas a proteção da imprensa (jornais, tv's e rádios, ou outras mídias), mas resguardar os legítimos interesses sociais. Não cabe aqui fazer-se espírito corporativista, para blindar negócios escusos, sobretudo inventando fantásticas justificativas sob o argumento de que setores do PT têm como tentativa desqualificar órgãos de imprensa. Não é verdade. Os fatos apontam em outro sentido. Tanto que a ombudsman da Folha de São Paulo, em texto publicado no dia 6 de maio, p. A8, diz que "grampos mostram que a mídia fazia parte do xadrez de Cachoeira. Que essa parte do escândalo seja tratada sem indulgência, com a mesma dureza com que os políticos têm sido cobrados. Permitir-se ser questionado, jogar luz sobre a delicada relação fonte-jonalista, faz parte do jogo democrática." Eis uma verdade, dita por quem demonstra ter isenção e que não veste a roupa do partidarismo midiática, que só vê para um lado. Nem sempre os fins justificam os meios. Na sociedade, há valores e princípios que devem ser respeitados e seguidos, de outro modo viver-se-á num caos. Não é isso que se quer. A liberdade de expressão é um direito e um garantia a ser usada em benefício exclusivamente dos interesses sociais, e não em benefício de criminosos e do crime organizado, como fez a revista VEJA.

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