Confesso que não sei. Refletindo sobre essa questão, lembrei-me de uma frase dita por um dos personagens do filme A Cor Púrpura, clássico do cinema universal, dirigido por Steven Spielberg, que alçou para o estrelato a atriz negra Whoopi Goldberg. A frase é: "Quanto mais as coisas mudam, mais parecem iguais." O que espero mesmo é que a onda de mudanças, processada no laboratório dos conflitos sociais de 2013, se cristalize neste ano de 2014, operando-se as transformações reivindicadas pelos segmentos ativos de nossa sociedade. O inconformismo foi, com certeza, a marca do ano de 2013, identificado nos movimentos sociais contestatórios, aplaudidos por uns, e criminalizados por outros. Fazendo um ligeiro comparativo, 1968, na concepção do historiador marxista Eric Hobsbawm, com as mudanças radicais que ocorreram na sociedade - generalização da industrialização, o substancial ingresso das mulheres no mercado de trabalho, a crise da família nuclear burguesa e o crescimento e acesso massivo dos jovens no ensino superior - instaurou uma revolução cultural, tendo como ideário político a defesa da autonomia da subjetividade e das escolhas de vidas pessoais, sem renegar o projeto de sociedade, assentado nos postulados do capitalismo. Já os reclames de 2013 põem em xeque as vigas mestras do capital, insurgindo-se contra o lucro desvairado em detrimento de outros avanços no âmbito da saúde, da educação, do transporte e da segurança. O que pode mudar? Só se vivendo 2014, que deve ser a continuidade histórico-política de 2013, para que se tenha resposta a essa provocativa indagação.

Gostaria que se pudesse dizer de 2013 o que disse, entusiasticamente, o jornalista americano Mark Kurlansky do ano 68: "Nunca houve um ano como 1968, e é improvável que volte a haver." Pensemos essa asserção axiomática voltada para o Brasil e, quiçá, pode-se chegar à mesma conclusão. O Brasil, na linguagem mais eufórica de alguns, sobretudo da mídia "revolucionária" (entre aspas mesmo), que, infelizmente, apoiou o triste golpe de 1964, acordou do seu sono, acalentado pelo berço esplêndido da inércia dos fáceis aplausos e das vaias intempestivas, a exemplo do que se deu com os apupos inconsequentes aos médicos cubanos, vitimados pelos seus próprios companheiros de profissão, num ato de insanidade contestória, sobretudo por seu viés preconceituoso. A propósito, esclareça-se: nem sempre os aplausos são aplausos; nem as vaias são vaias. Podem as vaias estar encobertas por outro sentido não desejado.
Em 2013, ano marcado por sucessivas manifestações, li no jornal (FS, 10/7/2013), que prefeitos vaiaram Dilma Rousseff, porque não comparecera à cerimônia de abertura da 16ª Marcha de Prefeitos. Como se tem tornado comum, foi dada relevância a essas vaias, estigmatizando a presidenta da república. Por ser um leitor que não costumo me influenciar por qualquer comentário ou notícia de nossas folhas, fiquei a pensar: - Ora, se os próprios jornais é que dizem que os prefeitos são maus gestores e, a maioria, corruptos, a conclusão acaciana a que chego é que as tão propaladas vaias nada mais são do que metáforas de aplausos. Então, é de uma evidência palmar que é melhor ser vaiado por administradores incompetentes e corruptos do que ser por eles ovacionado. Fato não esclarecido pelo jornal.
Independente desses acontecimentos, o ano de 2013 nos legou, além dos movimentos sociais reivindicatórios, algumas notícias boas e outras tristes. Em abril, morre Margaret Thatcher, a Dama de Ferro, quase no esquecimento contemporâneo, mas não da história, claro. Amada pelos liberais, e odiada pela classe popular, sobretudo as associações sindicais, que, nas suas mãos (de ferro), comeram o pão que o diabo amassou. Privatizou o que pôde. Se ficasse mais um pouquinho, nada sobraria da sua sanha entreguista. Não deixou pedra sobre pedra. Semeou mais ódio que amor, sustentando os seus ideais liberais. Mas..., aqui no Brasil, Daniela Mercury casa-se. Com outra mulher. Nada de inusitado. E o CNJ, na onda das mudanças, indo além do que diz a Constituição, aprova o casamento gay. E tudo continua como antes. Por isso, repito, quanto mais as coisas mudam, mais parecem iguais, já que, no mundo criminal, um garoto, de 13 de anos, mata a família em São Paulo. Essa notícia envelheceu antes que o ano findasse. E antes que mourejasse no esquecimento, um casal de irmãos - verdade: irmão e irmã -, que mantinham uma relação incestuosa, matou a mãe, que repudiava essa convivência sexual. A notícia velha ficou nova, e logo volta a envelhecer. Na sequência dos fatos, deixando-nos triste, morre o grande intérprete Emílio Santiago, de voz sublime e canto eterno. Logo o segue, para fazer-lhe companhia, Reginaldo Rossi, apelidado por muitos mal informados de rei do brega. Equívoco, pois, além de ter participado da jovem guarda, passou a ser o rei das canções de cabaré. Encontra-se-á com Waldick e Wando. Os três farão coro com o rebelde e, agora, global Tim Maia, acompanhados pela sanfona de Dominguinhos. Cantarão: Garçom, aqui nessa mesa de bar, você já cansou de escutar centenas de caso de amor. Para concluir, Waldick estribilha: - Eu também existo, eu também sou gente.
Nessas idas e vindas, o papa Francisco esteve nos visitando, para nos dizer que a fé é simples. Quem complica somos nós. Mandela não esperou muito. Partiu, sem sair do nosso lado. A liberdade lutada por ele jamais morre. E ele com ela. Madiba continuará eterno como Gandhi. Por tudo isso, feliz 2014! Com sonhos, ilusões e muitas utopias.