Encontrada a família do Gabriel, o homem maltrapilho de Parauapebas
A notícia está tendo muita repercussão na cidade paraense e nas redes sociais
Um final feliz para uma reportagem investigativa de quase dois anos. Finalmente, consegui encontrar a família do Gabriel Costa de Carvalho, o homem maltrapilho que percorre diariamente, descalço, as ruas de Parauapebas (PA), não aceita nada de ninguém, não pede nada e conversa pouco.
Na noite de sábado passado, conversei com o sobrinho dele, Audisney Carvalho, que mora em Brasília. Ele confirmou o nome do Gabriel e os nomes dos pais dele, que o próprio Gabriel havia me dito em entrevistas nos últimos dois anos: Benedito e Sebastiana. A conversa foi emocionante. Chorei muito de emoção. O Audisney me disse que a maioria da família dele já mora em Brasília há muito tempo, mas ainda há parentes residindo em Formosa (GO).
Segundo Audisney, o Gabriel sumiu certa vez e ficou muito tempo longe da família. Algum tempo depois, voltou, maltrapilho, foi bem cuidado, mas certo dia disse que ia embora e sumiu de novo. Deixou claro que gostava muito do Pará e de índios. “Ele sumiu há mais de 20 anos. Não tínhamos mais informações sobre meu tio, mas agora estamos felizes com esta notícia, graças a você”, disse o sobrinho, por telefone, também bastante emocionado.
Para eu chegar até o Audisney, foi uma longa batalha. Depois de publicar mais um apelo no meu face com o título “Ainda vou encontrar a família deste homem”, e ao lado uma foto com ele, tirada em nosso último encontro na Rua 14, no centro de Parauapebas, por volta das 13h de sexta-feira (26), a postagem repercutiu bastante nas redes sociais com mais de 1,3 mil curtidas, mais de mil compartilhamentos e centenas de comentários, e muita gente se mobilizando junto a parentes e amigos que moram em Brasília e Formosa, e mais de 1 milhão de acessos no mesmo texto publicado no site www.pebinhadeacucar.com.br, o sobrinho do Gabriel viu a publicação no Face de um amigo e afirmou que era o tio dele.
Ao saber da notícia, o secretário de Assistência Social de Parauapebas, Jorge Guerreiro, entrou em contato com o Audisney e com outros familiares do Gabriel e me passou a informação. Estava trabalhando durante todo o dia (sábado) na zona rural, fazendo reportagem para meu programa Conexão Rural. Ao chegar à noite, entrei em contato com o secretário Jorge, agradeci o empenho e liguei para o Audisney. Disse que na minha segunda conversa que tive com o Gabriel ele confirmou o nome dele, reafirmando o que havia revelado há quase dois anos e informou os nomes dos pais: Benedito e Sebastiana. Mais provas: eu disse que na conversa que tive com ele, o Gabriel revelou que tinha mais irmãos, “um bocado”, e citou dois nomes: Matias e Tonico, sem lembrar outros nomes. O Audisney confirmou tudo e disse que o tio dele, Tonico, já morreu. Tudo confirmado, veio mais choro. Depois, o secretário Jorge Guerreiro entrou em contato comigo e disse que havia conversado com uma sobrinha do Gabriel, a Vanusa, e ela confirmou a morte de seu pai Evandro Costa de Carvalho e revelou que Gabriel tem mais quatro irmãos e duas irmãs e enviou uma foto na qual aparecem as irmãs Zilene e Naiva e os irmãos Izaías e João (os outros irmãos já falecidos são Tonico e José).
Na segunda-feira, a Secretaria de Assistência Social providenciou uma passagem aérea de Brasília para Marabá para que o irmão do Gabriel, Izaías, pudesse vir para buscá-lo.
Ontem, eu e o secretário de Assistência Social de Parauapebas, Jorge Guerreiro, e o advogado da Semas, nos reunimos com um promotor no Ministério Público Estadual, com o apoio do presidente da seccional da OAB em Parauapebas, Deivid Benasor, para tratar das providências para que o Gabriel possa ser levado para Brasília. O Dr. Deivid entrou em contato com um cartório de registro civil de Formosa para tentar uma segunda via da certidão de nascimento do Gabriel e, também, para poder tomar as providências junto à Justiça sobre uma possível interdição dele.
Inicialmente, fizemos uma tentativa de aproximação para uma conversa dele com o irmão que veio de Brasília, Izaías, mas ele não quis papo com ninguém. Agora, o presidente da OAB tomará as providências necessárias para a interdição do Gabriel.
Guerreiro disse ainda que assistentes sociais e psicólogos da Secretaria de Assistência Social já tentaram várias vezes se aproximar do Gabriel e nunca conseguiram nem levá-lo para um abrigo ou que ele aceitasse roupa ou qualquer outro tipo de apoio, como banho e roupa lavada. Levando em conta que o Gabriel tem momentos de lucidez, o secretário de Assistência Social de Parauapebas informou à família que ele “deve passar por um tratamento psiquiátrico” e que acredita na rápida recuperação de suas faculdades mentais.
A cachoeira me ajudou a descobrir a sua origem
Tudo mudou, pelo menos no que se refere às origens do andarilho maltrapilho, a partir do novo e bem sucedido diálogo que tive com ele na mesma Rua 14, no centro de Parauapebas, a poucos metros do nosso primeiro encontro do ano passado, no dia 14 de agosto de 2018, por volta das 15h.
- Tudo bem?
- Tudo bem, respondeu ele secamente.
- E Formosa como está? Perguntei para a ver a reação dele:
- Tá bem, retrucou.
Aí, eu tive uma grande sacada de falar alguma coisa interessante que tem em Formosa, lá em Goiás, para ver se ele conhecia mesmo a cidade. Deu certo.
- Formosa tem uma cachoeira bonita... E, esperando a reação dele, indaguei: como é mesmo o nome?
- Itiquira, respondeu ele prontamente (Itiquira significa água que cai do alto. O Parque Municipal do Itiquira é administrado pela Prefeitura de Formosa. O salto do Itiquira é a maior cachoeira do Centro-Oeste, com 168 metros de queda livre, e fica a 280 km de Goiânia. Fonte: site oficial de Itiquira e www.curtamais.com.br).
E só para lembrar: no primeiro encontro, há quase dois anos, ele havia me dito que era de Formosa.
A partir dali, depois de mais de um ano e meio de “investigação” sobre sua origem, eu constatei que o andarilho de Parauapebas é mesmo de Formosa. Aí, liguei o gravador do celular e comecei a puxar conversa:
- Como é mesmo teu nome?
- Gabriel Costa de Carvalho.
- Você nasceu lá mesmo em Formosa?
- Não. Lá perto, respondeu, de novo, secamente.
- Você lembra o nome de teu pai?
- Lembro sim. É Benedito.
- E da tua mãe?
- Sebastiana.
- Você tem irmãos?
- Tem um bocado. Nem sei. Tem o Matias. O Tonico... (Talvez ele quisesse dizer que são vários irmãos e que não sabe o nome de todos).
- Você lembra quando chegou aqui ao Pará?
- Tenho 14 anos aqui.
- Você tem filhos?
- Tenho dois, mas ficaram lá em Cametá, respondeu o andarilho.
- Mas Cametá fica longe. É lá perto de Tucuruí, aqui mesmo no Pará, respondi e prossegui:
- Você trabalhava em que?
- Na juquira (mato que cresce no campo).
Sempre trabalhou na roça?
- Sim.
- Se eu conseguisse um emprego, você voltaria a trabalhar na roça? Perguntei.
A partir daí, o Gabriel deixou mais uma vez de ser o goiano Gabriel e voltou a ser outra pessoa e a falar palavras sem nexo.
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