Qual um bicho assustado na gaiola, foi assim como cheguei aos onze anos em São Luís ainda de calças curtas para fazer o "EXAME DE ADMISSÃO ao Ginásio", num tempo em que passar do 5º ano primário para a primeira série ginasial, principalmente nos colégios públicos, exigia o tal "Exame de admissão", um verdadeiro e temível  vestibular da época. As "escolas de exame de admissão" eram como os "Cursinhos" de hoje.
Era manhã, com cara de domingo. E quando fui à porta da rua, o que vi? A molecada inteira da rua e vizinhança num fuzuê danado, brincando com seus brinquedos! Uns puxando carrinhos, outros tocando corneta, batendo no bombo, sobrando apito, jogando bola, exibindo roupa nova. Diziam eles que, na noite, PAPAI NOEL lhes tinha deixado debaixo da cama brinquedos e presentes. E a molecada em festa! Fiquei só vendo.
E eu ali, me perguntando: PAPAI NOEL? PAPAI NOEL? Diziam eles que era um velhinho barbudo, muito legal que vestia roupas vermelhas e que na noite de Natal dava presentes às crianças. Mas que Papai Noel é esse? Eu me perguntava. E bem ali eu caía frustrado, decepcionado, ferido no meu ego ignaro, pois que PAPAI NOEL nunca-jamais visitou a minha casa e muito menos nunca me deu um único brinquedo, nada... nada...
Àquele momento, lembrava-me daquele nosso casebre lá no meio do mato, onde ficaram meus pais e meus irmãos, em que o vizinho da direita ficava a dois quilômetros e o da esquerda a meia légua. E me punha intrigado, ofendido e magoado com PAPAI NOEL que jamais acertou o caminho da minha casa; ao mesmo tempo em que me lembrava de outros moleques do meu tempo, que igualmente jamais receberam qualquer mimo de NOEL.
E contavam-se versões desencontradas e pouco explicadas sobre Papai Noel. Numa outra oportunidade também diziam que, na noite, o "bom velhinho" descia pela chaminé do fogão só para deixar presentes. E então o meu pensamento voou direto na chaminé daquela casa onde morei (na Vila), e logo vi que ali nunca-nunca ficou um único presente sequer. Nada... nada... e eu ali, frustrado pelo quanto relegado que me sentia. A terra continuou na rotação e na translação e, quando aos quinze ou dezesseis anos, conclui o Curso de Datilografia, passei, por compulsão, a escrever cartas feitas a máquina-de-escrever. Mais do que uma satisfação, uma exibição. Um atestado!
Foi quando voltei a disparar com força contra PAPAI NOEL. E, na minha irresignação e nas minhas lamúrias, bradava em carta: "NÃO TIVE PAPAI NOEL". E o mínimo que dizia sobre o velhinho de vermelho é que ele era preconceituoso; que não gostava de pobres; que nunca visitou a minha casa. Que escolhia os seus. Tanto assim que, mais tarde, ainda moleque - acreditem - acabei por escrever seguidos artigos no JORNAL PEQUENO, em São Luís, com o título "NÃO TIVE PAPAI NOEL". Era um tempo em que eu, moleque, não tinha acesso a jornais, nem rádio, muito menos a TV. E o mundo continuou na giratória. E só mais tarde, quando aos poucos fui me tornando dono do meu nariz, é que fui compreendendo os mistérios e a generosidade de PAPAI NOEL.
Devo dizer, porém, que, ao que pude sentir, ainda que mais tarde, paguei caro pelo meu ressentimento com PAPAI NOEL, pois que quando aproximava-se o período natalino havia sempre uma e outra "zebra" pelo meio do caminho e as coisas davam errado nos meus projetos. Eu interpretava como uma "lição" de Papai Noel - quiçá pelos ataques que lhes deferi. Era a lição da vida! Era hora de fazer as pazes. De entregar os pontos. Eu precisava me compor com PAPAI NOEL. E senti uma forte necessidade de estender-lhe a mão à palmatória e pedir-lhe perdão. E mundo dando voltas...
Justo a mesma máquina de escrever que me serviu de arma para atacar PAPAI NOEL, ela mesma agora como a bandeja e bandeira na qual eu me entregava vencido, compreensivo e agradecido ao "bom velhinho", pois que mais que simples brinquedo, ele, PAPAI NOEL, me dava como sempre me deu, vitórias, realização, bens materiais e tudo enfim o quanto um dia lhe pedi. E muito mais do que pedi e ainda que não lhe pedi e muito mais do que mereço e mereci.
Hoje eu vivo em paz com PAPAI NOEL. E ensinei ao meu filho ainda pequeno, presente nas mãos e o brilho nos olhares que PAPAI NOEL está em mim, está em ti, está em nós. Está na água que bebemos, no prato em que comemos, no chão que pisamos, no ar que respiramos. Está no pulsar das nossas veias, no pão das nossas ceias. Nas mãos para trabalhar, nos braços que temos para abraçar. No intelecto para pensar... aprender e ensinar. Está em tudo, está no ar. E o meu filho, inocente e lindo como sempre exclamava e perguntava. Ah! Então esse é que é o PAPAI NOEL? E eu lhe respondia: Esse é que é o PAPAI NOEL! E sorríamos e brincávamos e agradecíamos ao PAPAI NOEL nas alturas, lá no céu.

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Eu moleque, seis anos por aí assim, meu pai chegou em casa com um pequeno e aos meus olhos um lindo calendário, do tempo da "folhinha" (descartável a cada dia). Lembra? No calendário estava escrito: "BOA FESTAS..." E como para mim a palavra "FESTA" indicava festa de baile, de forró, festa da Conceição, festa de São Lázaro, festa de Bumba-boi, de "levantamento de mastro". Aí eu fiquei perdido. BOAS FESTAS?!
Um dia, quando me convidaram para uma FESTA de confraternização, dei um presente bacana e ganhei um par de meias. Fiquei frustrado! Em seguida, vi que aquilo foi mais que um presente. Um presentaço! Gostei demais! Tanto que, mais tarde, procurei infinitamente, sem encontrar semelhante par de meias. Ainda hoje nas manhãs, quando calço meias rumo ao trabalho, lembro daquele presente de "FESTAS" e vejo o quanto a vida é feita de lições. Lição sobre lição. Eis a vida. Eis a FESTA! E esse é o tema dos meus "discursos" nas FESTAS de fim de ano: uma lição que, enfim, aprendi!

* Viegas é advogado; é CIDADÃO DE IMPERATRIZ. E questiona o social. E-maill; viegas.adv@ig.com.br