Quando os meus neurônios não estão dispostos a produzir ou descrever temas exclusivos (ou inéditos), em intensas duas páginas em um só fôlego para este... CAMINHOS POR ONDE ANDEI, volta e meia recorro aos meus textos arquivados – uns que faço para o quadro RÁDIO VERDADE (Nativa / FM, Programa Arimatéia Júnior), outros que envio para o quadro PÁGINA DE SAUDADE (Mirante/AM, São Luís, manhãs de domingo, ao programa CLUBE DA SAUDADE.

Hoje, na pura veleidade, tomo dois temas, um de cada programa, o primeiro de Página de Saudade e o segundo de Rádio Verdade e intitulo-os de “Os melhores da Semana”; uma “reescrita” que volta e meia, com os neurônios emperrados, farei daqui por diante. Acompanhe.

LUIZA ONDE ANDA VOCÊ?

Era um ano daquele tempo que se perdeu no tempo. Foi quando conheci Luíza. Poetisa, falaz, cabelos negros, tom nasal, um tipo portátil. A vida então me ensina que nada acontece por acaso. Mas foi nesses acasos da vida que cruzei de passagem e olhares com Luíza. Nos vai-e-vem da vida, fizemos do nosso idílio uma praia de brinquedos que aconteciam por vezes no disfarce a céu aberto; por vezes no sussurro entre cortinas. E só então descobri que aquela Luíza, professora, falaz, romântica, cabelos negros, poeta, um tipo portátil e sensível, tanto quanto mulher era um vulcão em meio a praias, brinquedos e cortinas...
Certa noite, tarde da noite, em sua casa – em meio a sussurros, poesia, brinquedo e cortina – vi que mais adiante, lá na rua, o conjunto em festa tocava a música ANIMAIS IRRACIONAIS (de Dom e Ravel). Aquilo caiu como um bala de prata naquela cama de brinquedos entre cortinas. E a canção ficou na mente, naquele momento e para sempre... fazendo parte da gente...
Um dia, porém, Luíza se foi. E nem se despediu de mim. E só tanto tempo depois mandou uma carta. Era a poetisa que voltava em poesia como que em sonhos e declamações. Daí em diante tantas cartas que iam e voltavam, fazendo um selo daquele tempo que se foi. E a música, ANIMAIS IRRACIONAIS, sempre presente, fazendo parte da gente.
Nesse drama de sentimentos à distância, um dia cruzei os ares para sentir de perto os sussurros da poesia e para reviver um tempo de vulcão brinquedos, cortina e Luíza. E encontrei uma Luíza distante, indiferente, evasiva, sem mais poesia... reagente. Uma Luíza que, enfim, não me disse nada - que por mais que eu lhe tocasse, não se tocava em nada. E vi então que tudo se acabou... Hoje, lembrando aquele tempo, ainda ouço aquela praia de brinquedos e cortinas, aquele vulcão de emoções e poesia que se fez em Luíza. E vejo que tudo se fez uma página virada, esquecida, arrancada nesse meu livro de saudades... mas restou a música ANIMAIS IRRACIONAIS que um dia se fez presente, fazendo parte da gente.

“ASSIM COMO SÃO AS PESSOAS, SÃO AS CRIATURAS”

- Eu ainda era um jovem rapaz, quando li no para-choque do caminhão: “Assim como são as pessoas, são as criaturas”. A frase me confundiu, pois entendia ali que “pessoas” e “criaturas” são os mesmos entes, quer dizer, a mesma coisa. E guardei na mente a frase (do caminhão) e só mais tarde vim a entender a equação. “Assim como são as pessoas, são as criaturas”.
- Numa certa tarde, vi um pássaro (um curió), que acabava de ser preso, numa gaiola. Sentido com aquela prisão, paguei, resgatei o pássaro e soltei-o ao ar livre. O garoto então me disse que se armasse a gaiola novamente, aquele mesmo pássaro voltaria a ser capturado. Paguei para ver. Dito e feito! Aquele mesmo pássaro que acabei de soltar, daí a instantes, caía preso naquela mesma gaiola. Fiquei decepcionado. Mas essas... são AS CRIATURAS.
E as pessoas? As pessoas humanas? O sujeito apronta das suas: droga, arma, furta, atropela, vai preso. Por vezes passa semanas, meses, anos, uma banda da vida na prisão (qual aquele curió que paguei por ele). E quando saem, muitos deles, voltam na mesma semana, ou no próximo mês ou no próximo ano para aquela mesma, ou ainda que para outra prisão. Essas são as pessoas. - E quando não é isso a frase do caminhão, está nos casamentos – na família.
- Imagine uma mulher que casa ou junta com um homem: dois filhos, três filhos, quatro filhos: o cara é um bêbado, um ciumento, um desocupado, um drogado. E aí são maus tratos, porrada, humilhação, sofrimento. Uma gaiola! A mulher, com muita luta, um dia se livra dessa gaiola. Mas na semana seguinte, ou quando muito no mês que vem, ela cai noutros braços e, portanto, noutra gaiola. Essa são as pessoas.
- E o homem? Esse que a gente pensa que é o dono da gaiola e que está sempre com a gaiola nas mãos? Qual nada, é outro que cai como um curió! O sujeito está casado e é o último que vem a saber. Briga, faz cena, paga pensão e por vezes, em honra aos filhos, dá tudo para a mulher. E fica debaixo de uma gangorra. No ano passado, na semana que entra, no mês que vem o cara não aguenta e já arranjou outra sarna pra se coçar. Essas são as pessoas. - Finalmente, hoje eu entendo a frase do para-choque do caminhão: “Assim como são as pessoas... são as criaturas”.
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