Escrevi um texto: “IMPARRIÁ”. Imparriá, na linguagem da gente do meu sertão, é “aperrear”, atrasar; não desenvolver. Enfim, “imparriá”. Dias depois, quando fui ver o texto, cadê? “Imparriá”, imparriou. Foi-se pelos ares (coisa de computador). Já disse aqui sobre a desfunção do meu intelecto. Posso riscar um caderno inteiro, mas se perder o texto, jamais reconstruirei o caminho. Caio desmotivado.
Imparriá era gostoso, saudável e bem humorado e contava a minha trajetória na tentativa de “apanhar” um verde cacho de coco babaçu, a meia-altura. Nada deu certo. E o certo é que o cacho “imparriou” lá em cima, para todo o sempre. E assim como o cacho de coco babaçu “imparriou” lá em cima, “imparriei” eu cá embaixo, na escrita do texto.
E, como esse meu intelecto tem dessas coisas, transcrevo aqui textos que mandei para o programa CLUBE DA SAUDADE – MIRANTE/AM, São Luís (em cadeia local), nas manhãs de domingo, no quadro “PÁGINA DE SAUDADE”.

ÔLALÁ – ÔLALÁ

E lá se vai a molecada gritando, fazendo zoada, correndo atrás. Adrenalinas a mil!!! Era um grupo de FOFÃO que estava passando e marcando presença no carnaval da Ilha. Ôlalá... Ôlalá... esse era o refrão, o cumprimento, a fala monossilábica do fofão.
O fofão é(ra) um personagem presente, vivo e tradicional do carnaval da ilha-capital. Fantasiado com aquele roupão folgado, fantasia em tecido de chitão; cara escondida, máscara de espantalho, guizos à manga comprida; guizos na bainha ao tornozelo. E então o FOFÃO abria os braços, levantava as pernas às laterais, fazia piruetas e... Ô-LÁ-LÁ – Ô-LA-LÁ...
A molecada curtia adoidada o FOFÃO. Mas era como num jogo de adrenalinas. Ao mesmo tempo em que corria para cima, por vezes fugia, voltava. E o Fofão, palhaço e espantalho que já é(ra) a própria festa, fazia a festa e em meio aos seus guizos: abria os braços, levantava as pernas e... Ô-LA-LÁ... Ô-LA-LÁ...
Companheira inseparável do FOFÃO é(ra) uma pequena boneca de plástico que carregava nas mãos - sua arma, seu amuleto e meio de vida ali entre maisena, alvoroço e esguichos de água colorada. E o FOFÃO dava as cartas no carnaval. E porque cada um come do que tece, o FOFÃO esticava a sua bonequinha para o folião. Era a senha... queria um dinheirinho... para um “mé” lá adiante. Sim, porque ninguém é de ferro... muito menos no carnaval...
O grande trunfo do FOFÃO era manter o rosto coberto, escondido, tornando-se personagem incógnito, desconhecido – porque se levantasse a máscara e mostrasse o rosto, quebrava-se o encanto e daí o desencanto. FOFÃO de rosto exposto não era fofão. Era só um folião. E ainda ouvia-se uma frase de abandono: “eu te conheço, carnaval”. E aí não tinha Ô-LA-LÁ... Ô-LA-LÁ...
E assim vivia o FOFÃO: ora solitário, ora em pequenos grupos ora no seu bloco propriamente dito; marcando presença, divertindo-se e divertindo a galera; sempre com sua fantasia de chitão colorido entre guizos e maisena e sua cara de espantalho. E sua voz de fofão: Ô-LÁ-LA ... Ô-LA-LÁ.

QUANDO A CIDADE DORME

No centro daquela ilha do amor, situada à margem do Atlântico, entre o Rio Bacanga e Bahia de São Marcos, e Praias de São Francisco, Olho D’água, Araçagi – num dia que se fez anos e tantos anos – deixei os meus rastros ali.
Olho no templo e contemplo essa Ilha do meu Ronald Carvalho, diretor da minha eterna Escola Técnica Federal. E vejo na mente, de repente – ruas, becos e passagens – praças, cinemas, lugares por onde deixei meus rastros e imagem. E agora busco encontros, bilhetes, vozes, sussurros e mensagens. E elas... sempre elas... que hoje me fazem miragens.
Era noite quando eu cortava a cidade com as suas luzes acesas. João Lisboa, Rua Grande, Santaninha, Rua Asseio, São Pantaleão, João Paulo, Monte Castelo, Fátima e por que não? Velhos tempos - aqueles tempos - de uma juventude em pés no chão. A gente era feliz e pensa que a gente sabia? Sabia, não...
Era noite, final de semana, caminho de casa, baile de radiola, garota ao lado e a camisa sobre os ombros. E as luzes da cidade, acesas. Lembrança da brisa que vem do mar; do amor que ficou no ar, da moça que ficou pra lá. E aquela amizade, intimidade, gosto de felicidade naquela mistura com a brisa que vem do mar... dessa minha cidade.
Era noite. As luzes da cidade acesa, como numa relva, uma selva - um chão de estrelas. Agora aquele vulcão, fechando o ciclo da vida, está ao silêncio. Apenas uns poucos resistem... A cidade dorme. É QUANDO A CIDADE DORME...

· Viegas é o olhar do pássaro sobre o galho.
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