A primeira casa da minha criancice, em terra alheia, naqueles rincões de um tempo, havia ao seu entorno algo como um antigo sítio frutífero mal-cuidado, do qual a gente não se tocava nem da beleza nem da riqueza, nem da nobreza que era aquilo. Ao lado direito da nossa casa, havia um "mangal"; à frente do outro lado do caminho, outro "mangal" entremeado de cacaueiros, cajazeiros tangerineiras e jaqueiras, porém o que me destacava ali, nas reminiscências de um tempo, era uma antiga mangueira de MANGA CAJÁ que situava-se à beira da caminho, irrompendo o terreiro daquela nossa casa.
Um vez, duas vezes, escrevi sobre essa mangueira, publiquei no rádio, dediquei-lhe canções - sobre as lembranças que me despertava, sobre o sentimento que nutria por ela, sobre a distância de tempo e espaço que nos separava e, da última vez, era uma festa que se lhe fazia próximo a um breve encontro de então que tanto ansiava. Daí em diante, caímos no esquecimento e, como sempre, cada qual para o seu lado. Hoje, o caminho que levava a essa mangueira já não existe mais. Os pequenos lugarejos - Sertãozinho, Baixa da Folha, Carro Virô - que antes ali faziam passagem, também não mais existem. Eis o tempo! Eis a vida! Agora outra MANGUEIRA povoa e seduz o meu imaginário em conspirações e inspiração.

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Quando o meu cunhado WILSON desocupou uma nossa casa em que morou por quase dez anos, no Bairro do Bacuri - herdei deixado ali plantado pela D. VILANI, sua sogra, uma então jovem mangueira, ainda na "puberdade", para só então, tempos depois, presentear-nos com os seus primeiros e contados frutos. Trata-se de uma mangueira da espécie "MANGA DE QUILO", que produz lindíssimos frutos - graúdos, cheirosos, saborosos, tentadores.
Essa mangueira, sempre-sempre me despertou particular e merecida atenção. Linda, jovem, produtiva, de uma copa e sombra maravilhosas, sob cuja sombra tantas vezes, trabalho, organizo minha "marcenaria", local onde relaxo, descanso, reflito, converso e faço os meus projetos de vida. Sou apaixonado por sombras desde quando ouvi, ainda na primeira escola, um hino à árvore: "...ou flores ou frutos ou sombra darás". A vida real, neste calor tropical, também nos ensina e nos leva a esse cultivo.
Pois bem - essa minha mangueira teve em sua primeira frutificação algo como duas, três ou quanto mangas e mais nada. Daí em diante, disparou e passou a dar frutos em quantidade. Desperta-me a atenção o fato de que ela frutifica sempre "fora de época" em relação às demais. Ao longo dos anos, tem sido assim sempre. Não que seja uma temporona, mas porque essa é a sua índole, interpreto. Na última floração, frutificou contadas dezoito mangas, que, como sempre, divido e homenageio com o vetor da criação, a DONA VILANI que plantou - o que faço regularmente com carinho, estima e apreço, justificando desta última vez a escassez da produção.
Ocorreu nesse meio tempo que, a pretexto de proteção, finquei-lhe uma torneira (de água) ao seu pé, imaginando que assim, em tempo de verão, serviria em sua sede. Posteriormente, notei que a minha planta, com sucessivas aguadas ao seu pé, mostrava-se descorada, sem renovação de folhas, como se estivesse doente. Foi quando o meu pedreiro e companheiro de jornadas - O SALVADOR - orientou-me que "mangueira se vira sozinha e vai buscar água onde tiver". E mandou-me prestar atenção às mangueiras fincadas em terra seca ou pedregosa. Santa sabedoria!!!
Era do meu intuito, já faz algum tempo, podar essa MINHA MANGUEIRA, pois que apresentava extremidades de galhos ressecados, outros secos, inválidos - além do que uma imagem de descrença e decrepitude - como quem envelhece "precocemente" e por último estéril - se é que assim posso dizer em face a esse ente da NATUREZA. E então, com carinho, tomei a tesoura de poda, ferramentas amoladas, escada em quadripé, homem de serviço e lá sob a minha orientação em galho por galho, ponta por ponta, folha por folha, fez-se a poda, o desbaste. A mangueira lembrou-me, então, como uma jovem-mulher que "tomou um banho de loja", cortou os cabelos, fez a maquiagem, deu um trato e, então, está novamente linda, inteira, pronta para voar.
Não deu outra! Em seguida, o que vi em pleno verão?! Uma floração espetacular por todos os galhos, por sobre a copa, por baixo e por dentro desta. Fiquei extasiado! Feliz da vida! Falando sozinho! E fiquei atento par ver se a floração vingava, se prosseguia rumo à frutificação, até mesmo porque já havia frutificado este ano. Não deu outra!!! Hoje o que vejo são pequenos frutos em quantidade por todos os lados que prometem uma "carga" espetacular, como nunca.
Observo também, a este ponto, que temos frutos (verdes) nos mais diversos estágios: uns mais adiantados (já grandes e formandos), outros mais jovens e outros ainda na primeira formação, tal a diversidade! Também é certo que os frutos vingam vertiginosamente, sem "perca". E isso me leva ao delírio de imaginar que terei uma produção estendida que poderá perdurar por meses nesse meu devaneio. DONA VILANI, a plantadora - acompanha pelos meus informes, passo a passo, o desabrochar da floração e da frutificação. Digo que ela será servida. E eu continuo sonhando...
Acordado, vasculhando e meditando sobre aquilo tudo e, de olhos vidrados nessa beleza em formação, eu me ponho a imaginar sobre os mistérios da criação, da reprodução. Da seiva, da vida, da alimentação. Os desígnios do CRIADOR; a escrita suprema e o riscado preciso, incomparável, inteligente e ininteligível da MÃE-NATUREZA. E então os meus olhos se enchem à luz do que vejo; o meu coração se alegra e eu fico a me questionar sobre os mistérios e bênçãos e riqueza do Criador, da criatura e da NATUREZA.

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* Viegas é advogado e questiona o social. Email: viegas.adv@ig.com.br