Acabo de chegar da minha Baixada de origem onde estou nos últimos retoques da conclusão do MEMORIAL DE ANTÔNIO DE INEZ, uma obra a que edificamos para homenagear o pranto do nosso velho pai. Foram até aqui 25 viagens, em três anos e oito meses - uma tarefa que, em princípio, imaginava concluir em seis meses por três viagens.
A obra, de "memorial" só tem o nome, feito de dedicação e boa vontade, desprendimento e, sobretudo, originalidade. Um horto florestal com dez mil metros quadrados, cercado, beneficiado com casa, portão temático, cacimbão, "Praça da Trilogia" (em homenagem ao meu padrinho, minha madrinha e meu avô), portaria, área de estacionamento, tudo muito simples e original, cravado com um objetivo: velar a memória e respeitar o matagal, nele fazendo apenas sumários desbastes, num congraçamento entre a arte do belo e o toque da natureza.
O memorial de ANTÔNIO DE INEZ é entremeado de placas metálicas, parafusadas à altura, nas árvores de  acesso, na cor branca com letras azuis, plotadas, com os nomes dos pranteados (eles e elas), todos roceiros que viveram naquele meu pequeno lugar que na minha criancice tinha oito casas; depois onze ou doze moradas e que agora tem vinte e cinco casas - todas dos descendentes dos pioneiros -  numa extensão mediana de menos de três quilômetros de caminho em "Y". Outrora feito de casas de palha e chão batido e iluminado à luz de querosene e servido por uma pequena vereda - hoje tem uma precária estrada carroçável e é servido por luz elétrica. Esta que, apesar dos incontáveis pedidos, jamais fora instalada "in loco".
Das várias placas ali assentadas tem uma pioneira, cravada na haste de um antigo coqueiro, plantado pelo meu velho Antônio de Inez:  "AQUI ESTÃO AS MÃOS  DO MEU PAI". Uma outra mais adiante, à beira do caminho, é uma homenagem ao meu avô: "NESTE LUGAR / O MEU AVÔ DOCA BARROS / VIVEU, PLANTOU E COLHEU". Pouco ao lado uma outra placa homenageia a minha avó: "AQUI / UMA VOZ SE CALOU / E UM CORAÇÃO PAROU/ ERA A MINHA AVÓ JULIANA DE DOCA. E, bem ao lado, a beira do caminho, onde foi uma velha tapera, está uma outra placa: AQUI /FICOU A ÚLTIMA LEMBRANÇA / DO MEU TIO PEDRO DE DOCA". E à margem desse pequeno estirão de estrada, à altura de onde fora a sua tapera, tem uma placa dedicada ao meu tio e Padrinho: NESTE LUGAR/ O MEU PADRINHO RAIMUNDO DE DOCA / RESPIROU O AR DA VIDA/ PLANTOU AS SUAS SEMENTES E PARTIU AINDA CEDO DA MANHÃ. É que o meu amantíssimo e venerado tio e padrinho faleceu ainda jovem, deixando viúva e uma penca de filhos. É um coração que vejo e ouço e sinto até hoje! Até hoje!!!
Na área que compõe esse "memorial", existe um antigo poço do tipo cacimbão, construído há mais de 150 anos, por escravos, sobre uma rocha - pedra pura - por onde destilam minúsculos e quase imperceptíveis filetes de água, durante todos esses anos - uma das fontes que serve à pequena comunidade. Esse poço que já foi tema nestes CAMINHOS é um desafio e presença viva da vida e da NATUREZA e, brotando água, tem enfrentado as pesadas temporadas de seca, como ocorreu nos dois últimos anos. O local era conhecido como "VIRÔ". À entrada da pequena vereda que dá acesso público ao poço, mandei edificar-lhe duas placas em sua homenagem. Uma delas diz assim: "POÇO DO VIRÔ / O IDEAL DE UM FORTE / O SUOR DA ESCRAVIDÃO/ RESPOSTA DA NATUREZA/ FONTE DE ÁGUA E VIDA/ BÊNÇÃOS DO CRIADOR". A outra placa diz: "POÇO DO VIRÔ / EM TERRAS DO MEMORIAL/ UM MARCO DA HISTÓRIA E VIDA DESTE LUGAR / ÁGUA PARA USO DO POVO! SEMPRE!
Também fiz levantar à beira da estrada (do lado de fora da cerca) em concreto armado, o perfil da bandeira de um barco que caracteriza a minha assinatura (rubrica), um romantismo que vem dos tempos colegiais. Bandeira de barco, igualmente em forma da "praça" ali existente, do lado de dentro. E margeando o portão temático está a placa em homenagem à minha mãe, que diz o seguinte: "NESTE LUGAR / A MINHA MÃE DONA LOLA / CUMPRIU PARTE DE SUA MISSÃO/ SEGUIU EM FRENTE/ E HOJE É UMA PÁGINA DE SAUDADE" (De lembrar que "Página de Saudade" é um quadro que produzo e assino no Rádio/AM, Mirante / São Luís, oito da manhã, aos domingos.
E como esse memorial" é feito de originalidade, e placas e matagais, fiz levantar do lado direito do portão, em contraponto a uma outra dedicada à minha mãe, esta em homenagem ao meu pai: "NESTE LUGAR / CHÃO DOS NOSSOS ANCESTRAIS / ONDE SE PLANTA O MEMORIAL DE ANTÔNIO DE INEZ / À SOMBRA DOS MATAGAIS/ O POETA SONHOU OS SEU SONHOS / RISCOU E TRABALHOU O CHÃO / E CONSTSRUIU OS SEUS IDEAIS".
- É que o meu pai era um sonhador. Sonhou em não deixar os filhos na roça. E não deixou. Sonhou olhar a planície e a vida de um MIRANTE. E realizou. Acordava na noite e fazia seus planos na mente. E à luz do dia, sem lápis e sem papel e riscava os seus projetos ao chão. Justo o chão que ele tanto laborou e nele realizou. Daí a concretização dos seus ideais; daí o CONCRETO na bandeira do barco deste seu primogênito que, tanto quanto o velho pai, acorda na noite e, tão somente e na mente, projeta, "escreve", "questiona", "debate" e... à luz do dia realiza os seus ideais. Era assim o meu velho ANTÔNIO DE INEZ. Hoje cravado à sombra dos matagais.
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* Viegas revive as suas origens e,qual o seu pai, é um sonhador.
E, como da placa: "constrói os seus ideais".