*Viegas

Jirau. Sabe você o que é um jirau? Ouso traduzir que o jirau é uma geringonça dos tempos da escravidão. Um depósito, uma mais-que-segura plainada em caibros roliços ao teto da casa de palha, amarrados em cipó que, protegido pela altura, o roceiro estoca(va) víveres destinados ao alimento da família: arroz, feijão, farinha, tapioca, peixe-seco e outros. Meu avô tinha um jirau cheio de fartura. E não tinha aperreio. Aprendi com ele o ofício e a função do jirau. Tantas vezes eu de férias e de passagem pelo caminho e bem ali a casa sozinha. Eu ia lá ponta de pé e fazia o arrastão sobre o jirau do meu avô. Deitava, rolava, mexia, revirava e a conta deixava e ninguém pagava, mas se fosse descoberto - lá em casa, com certeza, uma surra eu levava.
Mais tarde, quando o meu velho DOCA, já viúvo, cumpria a sua sina, vítima de um “derrame” onde ficou recolhido e recluso no seu quarto, debaixo daquele jirau, ele e eu lembrávamos fatos e cenas que o tempo não apagou, girando em torno daquele jirau. E o meu velho Doca esboçava um sorriso raro de um roceiro e caçador forjado nas têmperas do sol-a-sol. E ele que recitava os versos em cordel de “Donzela Teodora” e traçava lições que aprendi, que pratico e guardo até hoje. Foi com ele que aprendi que uma pessoa conversa com outra, olho no olho. E dele tornei-me FÃ.
Hoje, quando acabo de chegar daquele chão, perto de onde plantou-se o terreiro do meu pranteado avô DOCA BARROS, onde ali construo o MEMORIAL DE ANTÔNIO DE INEZ – constituído de uma reserva florestal, cercada, com casa montada e tudo o mais para perpetuar a memória do meu velho pai e ainda que tendo no engenho da mente o texto que logo farei, mas ainda assim sem disposição a tritura, recorro agora ao meu jirau, onde tenho guardado textos em depósito e, entre outros, os temas que agora apresento, publicados que foram na viva voz deste autor, no quadro RÁDIO VERDADE – Programa Arimatéia Júnior/Nativa-FM.