No momento em que publica-se estes textos, estarei distante daqui a centenas de milhas, lá na Baixada da minha identidade, no chão que me viu nascer, em minha décima quarta maratona (em dois anos), onde construo o “MEMORIAL ANTÔNIO DE INEZ”, para trabalhar a memória do meu velho pai. E nesse caminho, pouco mais adiante, além da homenagem que presto aos decanos pranteados daquele outrora e sempre sofrido lugarejo, ergo também, naquela TAPERA que aqui já foi tema, uma singela homenagem ao meu avô DOCA BARROS – sabedoria e símbolo-cidadão que guardo na cabeça e no coração. De quem tantos anos que se foi, “ainda ouço a sua voz”... e sua lições.
EM TEMPOS DE PAPAI NOEL
Eu era um garoto, 11 anos de idade, havia chegado do interior e agora na capital, para tentar a sorte naquele meu primeiro “vestibular da vida” – o outrora famoso “EXAME DE ADMISSÃO AO GINÁSIO”, na minha eterna e dourada Escola Técnica Federal. Eis que, certa manhã, as crianças na rua, eram só alegria, felicidade e festa!!! Carrinhos, palhaços, cornetas. Brinquedos em cores. Presentes. Eu ouvia deles que “enquanto dormiam, PAPAI NOEL pusera-se-lhes brinquedos debaixo da cama”. E eu ali me perguntava: “PAPAI NOEL”??? E me respondia: “NÃO TIVE PAPAI NOEL”. Fiquei com aquilo na cabeça durante anos, sempre com a mesma frustração e resposta: “NÃO TIVE PAPAI NOEL”.
Mais tarde, quando conclui o meu CURSO DE DATILOGRAFIA, lá pelos 16, 17 anos, derramava as minhas frustrações a escrever sobre aquele velhinho de barbas e cabelos brancos, roupas vermelhas, saco de brinquedo às costas, vindo do fim-do-mundo que me ignorara na minha criancice e jamais fora à minha casa para um único brinquedo, sequer. Fazia guerras contra PAPAI NOEL. E dizia que “PAPAI NOEL NÃO EXISTE”.
Um dia, porém, o tempo e a consciência, senhores da vida e da razão, me colocaram frente a frente com PAPAI NOEL. E só então compreendi que sempre tive o melhor PAPAI NOEL DO MUNDO: vida, saúde, trabalho, liberdade, teto, família, intelecto, diploma na parede e anel no dedo. E uma incontida vontade de “dizer”... e de “escrever”. E mais: todos os brinquedos (todos os brinquedos) que sempre quis. Hoje eu agradeço e peço perdão a PAPAI NOEL. Naquele tempo, se não tinha brinquedos de papel, ele me dava um céu de esperanças, o ar da graça e um chão de oportunidades. E sem eu saber ele me dizia que o futuro se fez ontem e se faz agora. Agora e sempre... Amém!!!
- Obrigado PAPAI NOEL. Obrigado por você existir... na minha e nas nossas vidas. Obrigado PAPAI NOEL por mais um dia!!!!
ASSIM COMO SÃO AS PESSOAS, SÃO AS CRIATURAS
Eu ainda era um jovem rapaz quando li no para-choque do caminhão: “Assim como são as pessoas, são as criaturas”. A frase me confundiu, pois entendia ali que “pessoas” e “criaturas” são os mesmos entes, quer dizer, a mesma coisa. E guardei na mente a frase (do caminhão) e só mais tarde vim a entender a equação: “Assim como são as pessoas, são as criaturas”.
Numa certa tarde, vi um pássaro (um curió), que acabava de ser preso, numa gaiola, nas mãos da molecada. Sentido com aquela prisão, paguei, resgatei o pássaro e soltei-o ao ar livre. O garoto então me disse que, se armasse a gaiola novamente, aquele mesmo pássaro voltaria a ser capturado. Paguei para ver. Dito e feito! Aquele mesmo pássaro que acabei de soltar, daí a instantes, caía preso naquela mesma gaiola. Fiquei desolado. Mas essas... são AS CRIATURAS.
E as pessoas? As pessoas humanas? O sujeito apronta das suas: droga, arma, furta - vai preso. Por vezes passa semanas, meses, anos, uma banda da vida na prisão (qual aquele curió que paguei por ele). E quando saem, muitos deles, voltam na mesma semana, ou dias depois, para aquela mesma, ou ainda que para outra prisão. Essas são as pessoas. E quando não é isso a frase do caminhão, está nos casamentos – na família.
- Imagine uma mulher que casa ou junta com o seu homem: dois filhos, três filhos, quatro filhos: o cara é um bêbado, um ciumento, um desocupado, um drogado. E aí são maus tratos, porrada, humilhação, sofrimento. Uma gaiola! A mulher, com muita luta, um dia se livra dessa gaiola. Mas na semana seguinte ou quando muito no mês que vem, ela cai noutros braços e, portanto, noutra gaiola. Essas são as pessoas.
- E o homem? Esse que a gente pensa que está sempre com a gaiola nas mãos? É outro incorrigível que cai como um curió. O sujeito está casado, panca de machão e é o último a saber... Briga, faz cena, paga pensão e por vezes dá tudo para a mulher. E fica debaixo de uma gangorra. Na semana que entra, no mês que vem, o cara não aguenta e já arranjou outra sarna pra se coçar. E, então, a ciranda recomeça. Essas são as pessoas.
- Finalmente, hoje eu entendo a frase do para-choque do caminhão: “Assim como são as pessoas... são as criaturas”.
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* Viegas é esse olhar do pássaro sobre o galho e questiona o social – Email: Viegas.adv@ig.com.br
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