Havia um tempo e esta Imperosa de todos nós era uma enseada infestada de serrarias, oficinas de marcenaria e, cá pra nós, cabarés por todos os lados. Também para completar esse quadro caótico de poluição, vinham as chuvas e alagavam senão toda mas pelo menos parte da cidade. Vieram as "bocas de lobo" e com elas ou sem elas o drama permanece. Então esta nossa querida Imperosa era aquele drama-nosso: serrarias, marcenarias, cabarés, alagadiços...
Tantas vezes me peguei conversando com os meus botões e dizia para a minha ingênua sandice: legal, né? Aqui por perto de casa não tem uma serraria, nem uma marcenaria, nem um cabaré, nem um criatório de porco no quintal, nem um alagadiço. E eu mesmo na minha sandice ingênua: então eu estou bem e tranquilo de moradia. E sentia-me como sempre me senti e me sinto um filho querido e abençoado deste chão que me abraça e que o abraço a cada novo dia. E vamos girando na roda do tempo. E lá se vão beirando quarenta anos, aqui!!!
Certa feita, quando eu morava ali na minha eterna e única e queridíssima Manoel Bandeira, esquina com 13 de Maio, quando menos espero... olha o que vejo!!! Quase à frente da minha casa, um cabaré moderninho, com garotas mais ou menos, de meia idade, sentadas à porta, comportadas - como quem espera a banda passar. E lá pelas oito quando eu chegava para abrir o portão e estacionar..., sinto como uma energia forte, sei-lá-o-que, que focava em minha direção. Eram aqueles olhares-44 das moças sentadas à porta, esperando a banda passar. Eu fingia que não percebia, mas aquela "energia" me incomodava; afinal "ninguém é de ferro".
O tempo passou, a comunidade deu um giro, a minha vida também e quando dei por mim, vi que uma poluição desastrosa do tipo SOM DE CARRO, invadia a minha vida, a minha casa, o meu sossego. Vinha de um bar das cercanias, da Praça da União. Novamente, conversei com os meus botões, falei-lhes que fugi dos cabarés, das serrarias, das marcenarias, dos criatórios e dos alagadiços e agora estava vergastado pelo SOM DE CARRO. E eles, os meus botões, me disseram: eis a vida!
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Eu, filho e cria da minha Manoel Bandeira, tenho ali na esquina com a são Domingos o nosso escritório, lugar de trabalho e meio de vida. A Manoel Bandeira é a minha grande referência nesta cidade, estou nela há mais de 30 anos e todos os meus quase quarenta anos aqui, foram vividos no entorno dela. Morro de amores pela minha Manoel Bandeira e me autoproclamo um cidadão filho de lá.
Para lamento meu, no entanto, descobri que a minha Manoel Bandeira é uma "central" de ladrões de rua. Ou melhor: um ponto festejado e vigiado e dominado por ladrões vinte e quatro horas por dia. Tantas e incontáveis vezes, meus toca-fitas foram surrupiados de dentro do meu carro. As bicicletas que os meus colaboradores ou clientes estacionavam na rua do nosso escritório, não ficava uma. E depois dessas e outras levas permanentes, passaram a roubar as minhas placas metálicas (alumínio e bronze), com que me identificava em nosso escritório.
Por último, numa casa vizinha abandonada, lá eles montaram acampamento e durante 24 horas do dia, tudo aquilo em volta era varejado pelos ladrões e drogados e outros estroinas. Tenho até constrangimento em relatar os expedientes que praticavam nas minhas cercanias - dos quais fui vítima, assim como os demais. Então eu perguntava aos meus botões: de que adiantou eu me esquivar de marcenarias e serrarias e alagadiços, se vivo dentro de um pântano de ladrões? E eles me respondiam: eis a vida!
O tempo, divisor de águas e senhor da razão, foi passando. Alguns dos ladrões foram dizimados, "desapareceram", mas como a peste se reproduz, ainda hoje não pode ficar ao descuido uma bicicleta naquele meu setor que os larápios logo tomam de conta. E os tocas-fitas foi um propósito que fiz de nunca mais usar. Em parte posso dizer que "resolvi o problema". E os botões como sempre, meus confidentes.
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Agradecido porque não tenho nem uma serraria, nem uma marcenaria, nem um alagadiço nem um cabaré por perto, eu, ingênuo, na minha sandice, acabei por descobrir, no entanto, que à volta da minha casa, justo na minha Manoel Bandeira, havia plantada ali mais adiante uma central de ladrões. "Soube por boca dos outros". Só soube. Soube que a corja vivia abarrancada dentro de uma casa de aluguel. Imagine-se o bandalho dessa oficina!
Assim é que logo-logo me roubaram um gerador de energia e uma escada - tudo da porta da rua, sem que ninguém desse notícia. Imaginei, por uma questão de lógica, que o ladrão vinha das bandas da famigerada CAEMA (outra central!), ali mais adiante; porém agora quando conto nos dedos e converso com os meus botões, concluo que eram esses abarrancados que estavam ali pertinho da minha casa.
O que fico encafifado com tudo isso é o fato de que as pessoas em volta sabem que ali tem uma corja abarrancada; que a quadrilha tem por profissão o emprego do furto e roubo e que a dona Polícia Militar não fez nada em face da corja que certamente deverá estar igualmente abarrancada em qualquer outro lugar da cidade, estroina e fazendo o seu feitiço, de sempre.
Por tudo isso, voltei a conversar com os meus botões e, desacorçoado, lhes disse: esconjurei as serrarias, as movelarias, os cabarés, os alagadiços e, na velhice, caí nas mãos da poluição dos carros e dos ladrões acamados à volta de casa. E os meus botões, calados como sempre, responderam em silêncio: "...eis a vida".
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