(IN)FIEL DEPOSITÁRIO
E qual é o católico que não quer ser amigo ou ter algum grau de afinidade e de boas relações com o padre da sua paróquia? Os evangélicos não são diferentes! Viver sob as graças e simpatia do seu líder religioso é uma boa referência. O sujeito tanto lá quanto cá pode até tirar uma “carta de seguro”, num indicativo de que está no bom caminho e até mesmo ganhando um lugar ao céu. Afinal, ser amigo do padre (para quem é do padre) ou ser amigo do pastor (para quem é do pastor), isso não é pra qualquer um. Estarei certo ou estarei errado?
Eu mesmo, quando criança, lá pelos oito, nove anos de idade, vivia na maior expectativa de que e um dia aquele senhor padre, na minha terra, envergado numa batina negra, a mim me fizesse o menor gesto de cumprimento, o que afinal nunca aconteceu, restando-me frustrado, duramente frustrado por mais de uma banda da minha vida, até aqui. Tanto assim que, até hoje quando tenho pequenas tratativas com este ou aquele padre, costumo lembrar a minha frustração de criança, como se dissesse para mim mesmo: “os tempos mudaram e hoje eu falo com o padre. O padre fala comigo e até me conhece”! E acho legal, é claro, essa nova fase da minha vida!
Seu PêF é desse católicos convictos. Vai uma vez por semana, vestido em roupa boa à missa de domingo à tarde na igreja de sua paróquia. É amigo do padre. E o padre é seu amigo. Seu PêF é linha reta em tudo: nos negócios, na palavra, não fuma, não bebe, não joga. É de casa para o trabalho; do trabalho para casa. Mineiro ajeitado todo, “passo de ganso”, no dizer de Itaerço, referindo-se a LIVALDO, um guarda municipal que virou COMENDADOR . E, como se vê, está na reta do caminho do céu.
Sabe você, aqueles presentões, - doações que recebem instituições filantrópicas (de benemerência social) de órgãos oficiais de vigilância e repressão? São doações ora de carne, ora de peixe. E nessa leva, vindos de outra fontes, com o alvo na prestação social - são utensílios, cestas básicas e outros mimos. Sabe? Pois é, foi assim que o padre da igreja recebeu uma “estupenda” quantidade de madeira serrada: caibros, ripas, tábuas e outras peças. Uma carrada e tanta!
E agora (e agora), tanta riqueza em minhas mãos! E agora (e agora), o que fazer com tanta riqueza, com essa carrada e tanta de madeira! Irresignava-se o padre. Pensou... pensou. Botar no pátio da igreja, claro, que isso não era legal, quer dizer, despertava bochichos e cochichos. E na Casa Paroquial? Que tal? Muito menos! Isso iria suscitar mil pergunta dos fiéis e outras tantas especulações. Um incômodo, portanto. E olhava incrédulo aquela montanha de madeira que a paróquia ganhou de mão beijada de uma hora para outra e não sabia o que fazer. Entrou em meditação e... “Eureka”!!! Seu PêF, frequentador e fiel de sua igreja, era o homem ideal para tornar-se, digamos, uma espécie de “FIEL DEPOSITÁRIO”, enquanto o senhor padre não daria a devida destinação e emprego àquele madeirame gigantesco.
Afinal, seu PêF, além de bom sujeito, cristão católico e fiel, seria o homem ideal. Mineiro jeitoso todo, tinha sido dono de serraria, agora desativada e tinha um baita pátio, ali um tanto ocioso. E só uns rapazes que mexiam no local com uma pequena marcenaria. O tipo do local ideal em tudo para depositar, acomodar e guardar as madeiras do senhor padre. É como diz o ditério popular: “Mamão com açúcar”, mole, muito mole para o velho PêF e haja tranqüilidade e confiança para o padre da igreja com aquela carrada e tanta de madeira serrada – que num lampejo da mente e num breve momento se lhe pareceu um “presente de grego”. Pronto, seu PêF, mineiro jeitoso, era a solução para aquela situação. E senhor padre que também não é de dar murro em ponta de faca, coçou as mãos, han han...!!! E exclamou em silêncio: “Eureka”!, lembrando a histórica exclamação de Arquimedes (287 – 212, a.C.), ao descobrir a fórmula para encontrar o volume do ouro da coroa do rei grego, Hierão! Eureka! Exclamou em silêncio o senhor padre!
De posse daquela montanha de madeira serrada, seu PêF honrado com as atribuições de guarda e fiel depositário concedido pelo senhor padre da igreja, não se fez de rogado. E acatou o encargo com absoluta satisfação e sinceridade, como é do seu jeitão mineiro de ser. Foi lá no pessoal da marcenaria, ocupante do velho pátio de sua desativada serraria, agasalhou a madeira e fez uma ressalva direta e sincera. “olhaí pessoal, isso aqui é uma madeira do senhor padre da igreja. Vai ficar aí e ninguém mexe com nada”. Deixou e foi embora. Afinal, chefe é chefe e falou tá falado!!!
CH, o trupizupi fazia parte da trinca da marcenaria como outros também. CH de olhos brilhando e em silêncio comemorou o achado! Um achado e tanto! Logo ele que morava bem ali ao lado, dentro do pátio da desativada serraria, a dois passos daquele ouro do seu novo garimpo. Um achadão pra ninguém botar defeito! CH, que além de mentiroso e desacreditado tomava suas cachaças e derivava para outras drogas. Aí sim, EUREKA! Um tremendo “mamão com açúcar” ao alcance de CH e outros que tais.
Aí era uma tábua pra cá, um caibro pra lá, um “barrote pra acolá ”, uma ripa assim assim e não raro uma bolada mais adiante e aquele montão de madeira serrada, discretamente foi baixando, baixando, baixando e quando seu PêF deu por conta, aquilo já estava só os “quimba”, quer dizer, só a sobra, a restança. PêF mineiro jeitoso, sacudiu a cabeça, fechou o cenho e murmurou em silêncio: “Tem jeito não”... Ele tinha a obrigação de saber que no pátio sua desativada serraria tinha rato de dois pés.
Até que um dia... até que um dia... senhor padre precisou da madeira. – Seu PêF, cadê aquele “nossa” madeira?! PêF mineiro, jeitosão todo, perdeu o chão e foi nas nuvens! Sabe senhor padre, a turma buliu na madeira. Tinha o CH trupizupi por lá. Chamei o KS e botei ele até pra fora. Aí mineiro, jeitão todo, fez um acerto com o senhor padre peça terça parte, pela quarta parte, pela quinta parte mas a sua consciência de católico e cristão lhe denunciava que ele teria sido um (IN)FIEL DEPOSITÁRIO.
Comentários