GOIABEIRA: O SEU E MEU DESAFIO
Faz tempo e eu observo o desafio que enfrenta aquela jovem goiabeira. O desafio que aquele pequeno vegetal enfrenta também me desafia, vez que tento escrever um texto sobre o quanto vejo e o quanto me desperta, todavia não consigo articular nem conjecturar as ideias. E a omelete, que é o tema, por mais que eu bata na mente, não desabrocha, não cresce.
Quem anda na Rua Coronel Manoel Bandeira, entre as ruas Luís Domingues e Benedito Leite, no meio do quarteirão pelo lado esquerdo à mão do trânsito pode ver linda e majestosa, em com uma copa “horizontalizada”, em pleno frescor da juventude, entremeada de frutos ainda pequeninos, espalhados sobre suas galhas em meio ao “verde-folha” de sua ramagem. Simplesmente, impressionante! Mas é a cria da natureza e mão de Deus que estão ali!
Essa ainda pequena e jovem, porém viçosa goiabeira, que só agora me faz lembrar uma moça-anã (mais idade, menos crescimento), nasceu entre pedras, exatamente no ponto que faz um ângulo de noventa graus, entre a calçada alta e o concreto que faz o meio-fio, num local íngreme e jamais sequer imaginado que ali poderia nascer, crescer ou florescer uma goiabeira, em plena rua de asfalto. Mas é como diz a canção: “... Sobre montes de pedras / Também nascem flores”.
Passo por essa cria da natureza, obrigatoriamente, todos os dias de vez que moro pouco mais adiante. Por conta dessa vizinhança, tenho – ainda que de passagem - acompanhado o seu crescimento, como bem assim a tentação do desafio a que ela – goiabeira – se submete e ao desafio a que eu também me submeto ao imaginar sobre ela escrever ou descrevê-la – num texto, que enfim não desabrocha.
Já por umas três vezes estive contemplando-a olho no olho, cara-a-cara, proposital, junto de si. E me pergunto: como pode uma goiabeira nascer e crescer sobre pedras e entre pedras?! Domingo passado, vizinhos que somos, bateu-me um quê de interrogação e, debaixo de um renitente chuvisco fui lá, vê-la de perto, contemplá-la de certo. Pude observar que essa criatura de Deus está crescendo mutilada pelo pé, digamos. É que, espremida entre a calçada de pedra e a laje de pedra que faz o meio-fio (a sarjeta), a árvore não tem condição de desenvolver-se regularmente e vive espremida ao pé pelo inclemente pedregal que a circunda.
Tem mais, o crescimento e desenvolvimento natural do vegetal (da goiabeira), implica num processo de fotossíntese que é o processo do alimento natural, através da luz solar, entrando nessa cadeia alimentar o oxigênio, a glicose e o gás carbônico. Esse desenvolvimento (crescimento) natural, como se observa, faz-se em parte comprometido porque o vegetal não tem a “opção” do crescimento vertical (retilíneo) e o que se vê é que esse desafio e maravilha da natureza está crescendo em diagonal, adernando para meio da rua e já, neste ponto, ocupando o equivalente a quase metros da faixa aérea sobre o asfalto.
O desafio que enfrenta essa goiabeira exposta a céu aberto e em pleno asfalto, ou como se diria: “no meio da rua”, também desafia a mim, seu vizinho, admirador e acompanhante voluntário de sua trajetória. E que – temeroso, imagino eu - à qualquer hora, um vândalo ou destrambelhado condutor desses que infestam a cidade e o risco de transformar esse tesouro da natureza e da vida a uma galhagem seca e sem vida.
Aliás, que tal como se submete essa criatura, adernada para a rua e, portanto, para a linha do trânsito, vejo que ela submete-se (afigura-se) “surrada” em suas galhas laterais, frontais à rua. Enquanto isso, os pequenos frutos dessa bênção, ainda ao umbigo das flores de origem, a gente pode ver de cima para baixo, espalhados, multiplicados sobre a ramagem da copa dessa filha de Deus. E essa já é a terceira geração (de frutos) dessa “anã” de oito anos de idade!
Olhando esses frutos – benditos frutos – que prometem para daqui a pouco, sinto a minha mente sobressaltada por múltiplos imaginários que me empurram à incerteza e à descrença, como se estivesse a descer em queda livre, um túnel de outros tantos desafios. E nesse devaneio, lembrei-me então que certa feita u’a mãe angustiada ao ver o seu filho reduzido pelas malhas da justiça, pronunciara um ensinamento cristão: “Felizes as estéreis e os ventres que não geraram e os peitos que não amamentaram (Lucas 23:29).
De desafios esses, lembrei-me de um ensinamento a mim dirigido, ainda rapaz, por conta dos desafios que enfrentava já na publicação dos meus primeiros textos, no jornal, que dizia: “não se joga pedra em árvore que não dá fruto” e mais tarde fui levado a testemunhar e a compreender que “as árvores que dão fruto estão submetidas às pedradas” e às perversidades dos homens. Basta ver!!!
Olhando essa jovem goiabeira, com os seus pequeninos frutos pelos galhos, qual uma mãe de muitos filhos com a sua filharada em volta e ouvindo as lições da vida que a vida me ensinou, logo posso ver o futuro que a espera: as pedradas dos insanos, a violência dos malfeitores e, por ser mãe dos seus frutos, está cumprindo a dura missão que lhe reserva a face do chão. Daí que “Felizes as estéreis e os ventres que não geraram”.
E assim, goiabeira e eu vivemos esse permanente, instintivo e inevitável desafio – ela o dela e eu o meu, cada qual na sua dimensão - ao frio do seu cobertor ou ao calor do estertor. Mas a vida continua! E, cada qual – tanto ela quanto eu – cumpre a sua missão sobre a face da terra. Eis os desafios da vida! Os dela e os meus...
Edição Nº 15503
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