Ouço, com muita insistência, queixumes das pessoas sobre a "criação" dos filhos, hoje em dia. A gritaria é geral. Reclamam que não pode castigar, que moleque faz o que quer, que os fedelhos trazem "namoradas e namorados" para dentro do quarto junto a pai e mãe e que filho não obedece aos pais. E chiam barbaridade contra a lei que vem a ser o Estatuto da Criança e do Adolescente. "Não pode, tá errado, tá tudo errado e o resultado é isso que se vê: moleques matando, roubando, assaltando. E quando vai preso ainda ganha um refresco, um picolé...".
Esse é o grito, a inconformação das pessoas. Um grito abafado porque, enfim, fica por isso mesmo. A propósito desse "grito sem resposta" ainda vou desenhar aqui, um texto sobre a criação que vivi quando criança e adolescente, as tacas que levei, as "pisas" que suportei - a criação que vivenciei. Na época, doeu. Hoje eu colho os frutos como bem assim vi toda aquela gente plantar e colher.
Segue, agora, textos que os fiz: o primeiro para a crônica PÁGINA DE SAUDADE, Mirante/AM, domingos, oito da manhã. O segundo para o quadro TEMA LIVRE - TV Band, NOTÍCIA +, 5as. feiras.
LUA DE PRATA...
Era uma vez!!! Era uma vez naquele tempo de exposição agropecuária. Quente o dia e noite fria. Festa, brinquedo, embalos e alegria. Um tempo de noite rodada, muita gente, bebedeira e vaquejada. Lá em cima a LUA DE PRATA testemunha, conivente mas ingrata, porque da gente escondia futuro que só ela sabia.
Era uma vez! E naquela manhã de sol, tempo de exposição e vaquejada e lá vai ela solitária e engraçada - fruta madura, cheirosa e sensual, lembrava uma presa fugidia, mas um tanto descansada. E aquele cara, matador irrecuperável, carnívoro implacável, predador incorrigível e perigo inevitável estava ali, na mira, no rastro na trilha, pronto para o ataque!
Meu velho pai, um caçador ao seu tempo já dizia: Se pisar no chão faz rastro, se voar faz sombra". Era como se dissesse: ou dá ou desce! E nessa trilha a caçada no meio das gentes era inevitável. E voava pra cima - imperdoável. Caçador era terrível, matador, incorrigível.
E foi ali aquele cruzar de olhares, proposital de inevitável. E quando se deram por si naquele tempo de lua de prata, noite fria e vaquejada tinha festa na tribo, ora se tinha! Festas que se repetiam na noite, tantas noites e mais noites. Batiam os tambores, tocavam os maracás, faziam rituais qual um casal de indígenas solitários e perdidos nos matagais.
E feito pajés descobriam segredos, entregavam-se sem medo. Sussurros, entrega, carinho e refrega; muita festa e muita dança como numa cama que balança. E aí... haja criatividade e confissão; alegria invenção e fantasia - tudo muito, tudo muito e muito mais. E os dois bebendo na taça, deitando e rolando, pintando e bordando, fazendo pirraça, e querendo mais... muito mais!
Um dia, porém, aqueles dois caíram na real. Acabou-se aquelas festas na tribo em noites de sussurros, desmaios e "bacanal". Sim, porque a vida é feita de princípio, meio e fim. Princípio... meio... e fim. E cada qual partiu para o seu lado, cada qual no seu cada qual. Agora não tem mais sussurros, nem gritos, nem urros. Foi um tempo sem igual!
Agora, novamente é exposição, noite fria e vaquejada. Lá em cima lua de prata, cá embaixo lembrança, desejo e SAUDADE daquela mulata que desapareceu como uma caça... na mata... ingrata... Mas é assim: princípio... meio... e fim... É verdade! É a página de Saudade!
INVERSÃO DE VALORES
Ainda nos meus tempos colegiais, por vezes eu ouvia uma palavra: "inversão de valores". Em tempos e em lides profissionais no litígio entre as partes, tantas vezes usei e tenho usado a expressão "inversão de valores". - Só agora, porém, eu vivo na pele e sinto constante e vejo constante uma nódoa do social, um contrapeso terrível que vem a ser a inversão de valores. Refiro-me ao mundo e submundo do crime, com ações de bandidos. São ladrões, drogados, vadios e assaltantes que furtam, roubam e assaltam o cidadão; eles que chamam o trabalhador de VAGAUNDO.
Eles, os ladrões, os assaltantes, eles sim são os VAGABUNDOS (uma palavra que não faz parte da minha linguagem pessoal), mas logo enxovalham suas vítimas com a nódoa de VAGABUNDO. É a INVERSÃO DE VALORES. Quer ver outra inversão de valores? Está na relação Polícia / Bandido - Bandido / Polícia. Os bandidos estão sempre na frente, a Polícia vai sempre atrás. Tantas vezes os bandidos vencem a polícia; tantas vezes a polícia perde para os bandidos. E nesse jogo de perde e ganha, a polícia mais perde do que ganha, porque quando apreende uma droga aqui ou um bandido ali, a máquina do crime está instalada por todos os lugares.
Outra coisa: está na moda, agora, uma palavra que vem da própria polícia, destinada aos cidadãos: "Em caso de assalto não resista, atenda ao bandido; obedeça ao bandido". Obedeça ao bandido??? É bem verdade que resistir a um assalto é um jogo de vida ou morte, uma gangorra de TUDO OU NADA em que só o cidadão, a vítima tem a perder. O bandido nunca tem nada a perder. Afinal o bandido não vale nada. Sua vida de crime, no crime, também não vale nada.
- Mas essa de: "não resista", "atenda ao bandido", "OBEDEÇA AO BANDIDO", isso é cruel, é terrível, é a própria cartilha da polícia aos cidadãos. É essa a INVERSÃO DE VALORES a que ouço desde moleque. Bom dia!!!
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