...E ENTÃO É NATAL
(um tema em três textos)
Ainda moleque, lá pelos 14, 15 anos, o senhor meu pai me levou para fazer “o curso de dactilografia”. Tudo o quanto o meu pai ditava eu escrevia, obedecia. E então o curso de datilografia, se era da vontade do velho meu pai, então deveria ser “coisa de futuro”. E lá se vamos nós. Matriculou-me na Escola São José de Ribamar, do professor Carlos Galvão, no Bairro do João Paulo, ao que eu atravessava um socavão terrível, principalmente nas enxurradas e alagadiços do inverno.
O curso tinha quatro ou cinco máquinas de escrever todas quatro “antigonas”, coisa para ferro velho, hoje, a 15 centavos o quilo. Uma delas, igualmente como as demais, era o xodó do mestre, a estrela do curso e seu bem maior. Só os “adiantados”, em maratonas de prova, nela podiam tocar. E olhe lá! As demais compunham a rotina do tic-tac do dia a dia. E vamos que vamos... ASDF – ÇLKJ – QWER – POIU e assim por diante, lição-a-lição, sempre com o teclado encoberto por uma semigrade em madeira para exercitarmos a datilografia sem olhar para o teclado, tal como o faço até hoje.
- Entrei naquilo e, de repente, estava empenhado naquele meu curso de datilografia. Aproveitava à risca os 60 minutos do horário. Gostava da brincadeira. Levava a sério e me sentia bem com tudo aquilo ali. O curso era previsto para seis meses mas... com quatro meses, em aproveitando uma turma que iria para o “exame de aprovação”, o mestre me disse que eu teria condições de submeter-me à prova. Olha a audácia!
Era gente de fora que viria compor a “banca examinadora”: gente de banco, executivos do serviço público e do comércio, educadores - todos amigos do mestre, tudo gente fina. Nos últimos 15 dias, passei a treinar naquela antigona máquina-xodó do mestre. Contudo, parece que eu saía de uma carroça e entrava num avião. Imagine! E aí foi uma disparada! Não deu outra! Fui aprovado em primeiro lugar ganhando de veteranos que jaziam por lá.
Concluído o curso e sem máquina de escrever ao meu alcance, eis que nas noites acordadas eu escrevia na mente, numa imaginária máquina de escrever e num teclado igualmente imaginário, os textos que eu igualmente imaginava. Um exercício da mente que eu tocava até adormecer. E assim fui “treinando”, sem máquina e sem teclado, os meus exercícios em datilografia. Foi aí que veio o Natal.
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Afiado em datilografia, lembrei-me de que quando criança “não tive Papai Noel” e então comecei a disparar contra Papai Noel. E aí... anos seguidos, lá se vai chumbo e mais chumbo contra “aquele velhinho barrigudo”, de “barbas brancas”, “sempre com um saco às costas”, “bonzinho com uns”, “generoso com outros” e “indiferente para com outros tantos”, sempre com o título NÃO TIVE PAPAI NOEL. E acabava atingindo meio mundo ao redor. E tornei-me adulto sempre atirando e jogando contra Papai Noel, tal a minha frustração de criança.
A certa altura dessa ignóbil batalha, acho que despertei para a realidade e vi que o MEU DEUS, SENHOR E CRIADOR, não gostava disso. E, por isso, sempre que era NATAL comigo já pelos vinte e tantos, trinta e tantos, eu me via punido, vergastado, surrado, empurrado a me convencer, ainda que pela dor de que aquela minha “revolta” não tinha razão de ser. Foi aqui que eu parei. Parei para rever os meus valores, os meus caminhos, a minha história, as minhas conquistas e as oportunidades que tive na vida.
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E então pedi perdão a Deus, reconciliei-me com Papai Noel e disse a eles que nunca mais atiraria contra Papai Noel, nunca mais me revoltaria contra o Bom Velhinho e que se tivesse que usar o teclado, faria para enaltecê-lo e para confessar que, isto sim: tive, como sempre tive, um baita Papai Noel, ainda que sem saber, num tempo em que só olhava para os pés. E então foram-se embora os meus problemas durante o Natal.
Hoje eu vejo o quanto Papai Noel tem sido generoso para comigo. E que, se não visitou aquela minha casa de palha e chão batido, sem porta nem na entrada nem saída é porque ainda não era o meu tempo. E porque na vida tudo tem um tempo. E que o tempo de Papai – aquele Papai Noel dos meus sentimentos – não é necessariamente o meu tempo, o nosso tempo. E, nessa ótica, passamos a conviver pacificamente, compreensivamente. Tranquilamente. E então é Natal.
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E ENTÃO É NATAL! Hoje eu vejo, neste tempo, uma correria exasperada das pessoas às compras. Brinquedos, roupas, relógios, celulares, presentes, pacotes enfeitados, luzes acesas, carro-zero, dinheiro derramando, muitos apertados, outros dependurados, mas é o tempo das compras. Ou tem brinquedo e presentes ou não tem Natal. O comércio e os comerciantes fazem a festa, empanturram-se com a festa.
Vejo então que as pessoas estão focadas não no espírito natalino, ao festejo da chegada do Redentor sobre a face do chão; Ele que se fez homem para redimir a nossa CULPA e, afinal, pagar pelo nosso pecado com a morte na cruz. Vejo então que as pessoas estão voltadas para os comes e bebes, para a festança do rega-bofe, para os zero-oitocentos por aí, para a broa e para a proa. Não para o Rei e sua Coroa.
E ENTÃO É Natal! E então eu paro no tempo e agradeço a Deus, pela maravilha de um Papai-Noel que eu ainda que não tivesse nada ao tempo daquelas minhas poucas roupas do bate-revira-e-veste; lá mesmo naquela nossa morada sem eira e sem beira – confesso hoje que tinha como sempre tive e continuo tendo um generoso e farto Papai-Noel que eu não sabia e, que por incrível que pareça, grande maior parte das minhas vitórias sempre foram às vésperas do Natal! E então é Natal!!
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