DOMINGO: O DIA DAS MINHAS SAUDADES

Domingo é o meu dia de saudade. De matar a saudade. De viver a saudade. Como todos os dias, de criança até aqui, acordo cedo e levanto cedo. É uma das virtudes a que pratico. Gosto disso. Não abro mão disso. Aprendi, na motivação ao trabalho, que “Deus ajuda a quem madruga”, então eu sou madrugador. E carrego isso como um princípio de vida, uma história de vida. Desde a casa paterna, passando pela “casa alheia”, a vida no internato, na república, na casa do estudante. E dessa rota aqui. Então, dou GRAÇAS ao Senhor por isso...
Domingo. Ainda no lusco-fusco da manhã, chamo a companheira que já se faz acordada, vou ao banho e juntos vamos para a Santa Missa das seis e meia na Igreja da Matriz. Padre Felinto é o meu padre! Eu disse isso para ele, mas ele replicou que é “bondade minha”. Depois da missa passo pela Padaria do Veiga e já venho comendo o pão até chegar em casa. Como pão uma vez por semana, aos domingos.
E quando venho “degustando” o pão, faço aquilo como uma solenidade, uma liturgia, um ato de agradecimento ao lembrar os meus tempos de criança em que O PÃO foi o meu quase-inacessível e distante oásis. Um bem que eu sonhava ter em mãos. Um prêmio, um troféu que as pegadas da vida àquele tempo me distanciaram como num muro a que quase não pude acessar. Mas tudo isso valeu: foi uma grande e grata e inesquecível lição. Lição que aprendi.
Hoje, domingo, meu dia de saudade, “degustar” o pão, antes de chegar em casa e agora já em casa, é como uma prece de agradecimento ao SENHOR da minha respiração, ele mesmo dos meus passos, da minha visão. E sempre peço à minha mulher que mantenha o pão-diário farto sobre a mesa e depois dela. E nisso me realizo. Ela sabe disso!
O pão sobre a minha mesa matinal, aos domingos, na minha casa já se faz concluído antes das oito. Às oito fico atento: é que ouço no rádio/AM a minha crônica PÁGINA DE SAUDADE, o Programa CLUBE DA SAUDADE. E com ela a música que continua contando a história – tudo objeto da minha criatividade e produção. É outro ponto onde me realizo. E realiza-me saber que os ouvintes pedem a repetição do texto, a repetição da música.
Domingo, esse meu dia de saudade, é igualmente o DIA DE FEIRA. Vou à feira-livre todos os domingos. Antes no Mercadinho, agora no BACURI. Gosto de sentir o cheiro, a cor, a multicor das frutas, das verduras, das polpas e de tudo aquilo ali. Lá eu me encontro e reencontro com os idos da minha juventude; aquele garoto sem um tostão no bolso e que se sentia traído pelas impossibilidades e tentado pelas variedades que a feira oferece. Hei aquele meu velho tempo! Outro muro do pensamento.
E volto da feira pra casa às vezes quase sem nada. Fui lá só pra matar saudade. Às vezes carregado: ingás de metro, cachos de tucum, banana, laranja, tanja, lima, coco, bacuri, pitomba, abacate, cacau, azeite de coco, bolo de tapioca, cajá-do-pará, cupuaçu, cajá-umbú, farinha, bacuri, pequi. E toda essa tentação, esse cheiro e essa multicor a invadir os meus setenta, na saudade daqueles meus 15, 16, 17 – num tempo em que o acesso se fez em muro. Muro alto. Doeu, eu sei que doeu. Mas valeu, hoje eu sei que só valeu! Afinal, é caindo que aprendemos a levantar!
Hoje é domingo, dia das minhas saudades. Em casa temos um TIM-infinito (por 25 centavos a ligação) + R$ 135 em bônus da Oi e Vivo + créditos. Começo ligando para uma águia que é a minha irmã Goretti. Ela fala que se esquece da vida e do mundo. Dona de uma retidão e de um argumento que só o céu é o limite. Depois ligo para outro irmão – ZÉ BRANCO, uma raridade em pessoa humana. Generosidade e modelo de cristão só até ali. Falamos o básico, mas sempre numa reprise nas coisas do nosso velho tempo: casa dos pais, mistura com os irmãos, lição dos antigos, a “mesa” da família em que ele, recanteado, a mamãe acabava se esquecendo dele. É quando a gente chora em nossos próprios sorrisos.
Depois ligo para o meu irmão-paterno, o Afonso. Aliás, ligo para ele todos os dias (todos os dias) ao amanhecer. Por vezes duas e até três vezes ao dia. Essa rotina já faz cinco anos. Afonso é um ser humano acima da média. Adjetivos infinitos. Um advogado-nato, verbo fácil. Repostas prontas. Esse, sim, puxou ao meu pai! Na carona falo com sua mulher, a minha cunhada NECA. Mais que uma cunhada, uma irmã, uma madrinha, uma bênção. Uma mão-aberta, disponível, única, incrível e a vida inteira.
Hoje é domingo. Dia das minhas saudades. Então ligo para a “Comadre Sibá”. Sibá é vizinha, mora em frente ao sítio florestal com benfeitorias diversas que meu irmão/ZÉ BRANCO e eu empreendemos e que denomino MEMORIAL DE ANTÔNIO DE INEZ. Sibá é uma mediana-jovem senhora-casada, é a “curadora”, a administradora, a zeladora, a faxineira do “Meu Memorial”. Ligo para ela 3 ou 4 vezes por semana, inclusive aos domingos. E busco diário as mesmas informações do local; águas do poço, a cerca, as placas, o verão, a limpeza do local, as folhas do chão. E ao final, de nossas conversas, choroso, encerro com um doído e saudoso: “dê lembranças para o meu memorial”.
Hoje, domingo, é o dia das minhas saudades...
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Em tempo: o verbo “DEGUSTAR” e suas variantes são próprios, senão exclusivos, do articulista NELSON BANDEIRA em seus textos neste jornal. Então, o uso que deles faço tenho o sentimento de PLÁGIO, de uma cópia mal-feita, por isso seguem cercados de ASPAS para assegurar a originalidade ao verbete que o preclaro NELSON BANDEIRA lhes aplica com absoluta propriedade. (rsrsrsrs rsrsrsrsrs).