UM DIA DE CÉU E MAR

Era uma tarde de céu azul, de verão. Era por volta de 1977. Isso faz só uns 23 anos. Na época eu um ex-exilado morador  destas barrancas do Rio Tocantins, tinha sempre um bom motivo para refrigerar as lembranças e as saudades daquele chão daquela outrora toda minha ilha-capital. Saudade danada! E eu fazia de tudo e tinha sempre um pretexto para rever a cidade dos azulejos. E assim matar aquelas  saudades tantas, daquela ilha de meus tantos encantos. 

Parecia que era uma “sina”, numa crise existencial. A Praça João Lisboa, a Avenida Beira-Mar, a Praça Deodoro, a Pedro II,  Rua do Passeio, o Bairro do Monte Castelo, um Trecho do Lira – eram lugares em que a minha alma cantava e decantava suas lembranças, suas saudades!!!  Rever e andar por ali era como um descanso para a minha alma –a alma de quem saiu da cidade mas a cidade não saiu de mim.

Naquela tarde, eu estava na Praça João Lisboa, na confluência com a Rua Grande, com um olhar na giratória rumo à Magalhães de Almeida – como quem se certifica, revê e compreende a cidade, um chão que por um tempo o foi meu. Era ali um cruzamento, um sarilho, um vai e vem de tanta gente, naquela  tarde ludovicense de céu azul. De repente, não mais que de repente, olha quem eu olho!!!!! Aquele ex-amor!!! Que explodiu em mim qual uma bomba, arrasadora, avassaladora, a mil megatons. Numa  fração de segundo e por força da mente fui nas estrelas e voltei. Precisava de lucidez!!! E perguntei. E você? Que te fazes nesta vida? Por onde andas? E declarei quanta saudade! E concluí tentando me recompor: Hei mundo que dá voltas!!! Prazer em te ver.

Foi aquela conversa breve, ali em pé e parados na multidão na confluência da João Lisboa com a Rua grande, naquela tarde de céu azul. Mas eu não podia perder nem aquela casual oportunidade, nem a viagem e arrisquei; “E aí, quando e como que eu te vejo?  Quero conversar com você. Quero falar de mim e quero ouvir você? E insisti: como é que te vejo? Onde é que eu te vejo? Aí veio uma resposta direta e reta: amanhã, às dez horas na Ponta d’Areia!!! Carambas! Saí dali perdido em mim mesmo, quase sem direção. E logo pude prever que na tribo ia ter festa!!!

Lá adiante, ali mesmo na praça, aquele meu fusca azul, malandro safado, mulherengo e treiteiro, porém confidente e companheiro, que houvera observado e imaginado e entendido todo o clima foi logo me perguntando: E aí? E aí, deu Rock? E insistiu: Onde é que eu entro nessa???  Qual é cara, fica quieto, fica na tua, respondi. Ele, irreverente e atrevido me respondeu: “Já sei, vou ter serviço.É sempre assim!!!”.

No dia seguinte domingo, dez o dia, fusca azul e eu, estávamoa lá: no local combinado, na hora combinada em plena Ponta d'Areia!!! De repente, não mais de repente me chega aquela máquina!! Uma morena inteira, inteirona! Só de bikini! Aí quem rodou fui eu. E fusca azul lá adiante olhando com cara de mau, como se quisesse entrar na festa. Despistei, fomos saindo. E aí de cara sugeri um drinque prá calibrar. Pra começar. Run com água de coco! Mais outra dose, prá calibrar, prá detonar.  

E como quem tá na praia é prá se molhar e para uma cor pegar, aí a gente foi pegar uma onda, se molhar, se queimar. Papo vai, papo vem, aquela conversa incontida, tanta coisa prá falar, outras tanta prá ouvir - sabor de coisa gostosa e cheiro de coisa proibida, tanto quanto enlouquecida. E a gente lá, aquele maquinário inteiro, cara a cara, olho no olho, mãos pelo corpo, como quem sente o sabor pelo tato. Um trem e arrepiar!!! Mas ali, com tanta gente em volta, não dá!!!

Aí... naquela cumplicidade, com a gente picado pela ansiedade... fomos saindo... saindo... pegando a orla da praia e fomos tocando rumo ao INDEFINIDO. E quando o nosso imaginário, sem se dar conta de nada, ao tempo em que a ilha era inocente,  naquele deserto de céu e mar, com os nossos corpos se enrolando na areia, ma Praia da Ponta d’Areia, a gente escreveu o último capítulo daquela nossa trajetória, que eu guardo como num livro de tantas memórias! De volta, às barrancas do Tocantins, na minha coluna do jornal, na crônica VISÃO GERAL – escrevi: “O CÉU E MAR POR TETESMUNHAS. E tanto lá quanto cá, ao sabor da imaginação!!!