SAUDADE...

Se me perguntassem o que é saudade, eu diria: saudade é lembrança; é marca do que se  foi.   Saudade é o rastro do tempo. Saudade é o passado que se faz presente. Saudade é o ontem que se faz agora.  Saudade é um trecho da história. Saudade é nossa  cabeça, é o coração – é  memória.

- Saudade é aquela casinha de palha e chão batido, da infância; luz de querosene e tudo lá na distância... -Saudade é o meu pai – poeta e guerreiro; argumento, decidido e altaneiro... Saudade é minha mãe, firme e decidida, humilde e tolerante em toda a sua vida.

- Saudade é o meu grupo primário, farda em azul e branco, calça curta e pés no tamanco. E as moças cantando cantigas de roda: “Sapequei o pau no gato-to-to”, “Ciranda cirandinha, vamos todos cirandar”. Saudade é o internato na minha ESCOLA TÉCNICA, no Monte Castelo. Lá a gente virava gente. Café, almoço, jantar, roupa lavada e engomada. Escolaridade, conhecimento, cultura – tudo da melhor nomeada!!! 

Saudade é a torcida por aquela minha escola. Saí de lá e não torci por mais ninguém nem por mais nada.  Saudade é aquela farda, tempo do ginásio: nas calças  listras laterais; na caminha tinha platinas, ao peito engrenagem gemada. A gente era feliz e não sabia.

- Saudade é aquela canção antiga  que lembra o que só a gente relembra e que fez parte da nossa vida.  - Saudade é a minha avó e os cuidados com suas rolinhas fogo-pagô, no capim rasteiro do terreiro da casa do meu avô. Saudade é a “gritalhada” entre irmãos. É o quintal da nossa casa. Laranjeira... goiabeira... E ainda tinha aquela florzinha que a minha irmã despetalava: “Casa, não casa. Casa, não casa”.

- Saudade são as ruas em que caminhei e os passos que por lá deixei.  Saudade é aquele amor: terno, eterno, proibido, escondido. Primeiro ou derradeiro. Ainda que esquecido. Ainda que feito de emoções ou intrigas e em tudo fazendo os traçados da vida. É o namoro na porta de casa. Dez da noite. Hora de voltar pra casa...

- Saudade é a minha rua, os cabelos negros, os passos apressados. Os sonhos do amanhã. - Saudade é lavar  e engomar roupa. Vestir e sair com a garota. Saudade é o circo, o cinema, o escurinho do cinema.  Saudade é a gente, pela rua ao lado a pessoa amada e comer a mesma maçã junto com a namorada. Saudade era a gente falar errado, sem culpa e sem pecado.

- Saudade é o guaraná, o picolé, chiclete, “ping pong” e a goma de mascar e fazer “ploc”. É a escola, o caminho e o vai e vem da escola; os livros e cadernos e a farda da escola.  - Saudade é o refresco com pão, o sorvete de coco e maracujá, é banho na chuva, jogo de bola de meia. É o murici da praia do olho D’água e as travessuras na Ponta D’Areia. Saudade é a Praia Grande e os encantos da Praia Grande.

Saudade é aquele amanhecer no Monte Castelo com o Boi de Lorentino vindo das bandas do Cavaco e sacudindo a Ilha.  É o gelado de gelo raspado de Seu Machado: murici, abacate, banana e tudo o mais. Saudade é pegar o estribo do bonde, e a brisa que vem do mar. Camisa volta ao mundo, calça de naicron e cabelereira cheia. São os embalos de sábado à noite nos tempos iê-iê-iê. Saudade são aquelas noites, fim de festa camisa no ombro, caminho de casa. Seu um tostão no bolso.

- Saudade é “A banda” de Chico; O  Calhambeque de Roberto, A Carta de Valdick; Aquele Abraço de Gil. São AS 14 MAIS nos discos negros de vinil, rodas da Curriola na Rua Grande, jogando conversa fora.  Saudade é a amplificadora lá em cima e moças cantarolando cá embaixo.

Saudade é o CLUBE DA SAUDADE. Passa a semana inteira sem ele e só domingo (só no domingo), lá vem ele, falando de saudade e deixando saudade. E ainda diz que “Saudade não mata, só ajuda a viver”.