O CHÃO DOS MEUS ANCESTRAIS. 

Deixei a casa paterna aos sete anos de idade, numa manhã fria, com a minha mãe chorando pelos cantos e o meu pai incisivo e determinado na minha escolaridade -  para morar em casa alheia e continuar o primário, na VILA. A partir daí, e pelo resto dos tempos, voltava à minha casa, como visita, nas férias escolares mas sempre no trabalho da roça, como os demais. 

Depois do emprego público,  aos 21, voltava por vezes, nas férias do trabalho e às vezes nem isso. São as voltas que o mundo dá.  Uma canção de Chico Buarque diz que: “A gente quer ter voz ativa / No nosso destino mandar / Mas eis que chega roda viva / E carrega o destino prá lá”. Ela mesma noutro trecho também diz: “No peito a saudade cativa / Faz força pro tempo parar / Mas eis que chega a roda-viva/ E carrega a saudade pra lá”

O mundo deu tantas voltas, as águas correram por debaixo da ponte, passei tantos anos quase sem voltar ao meu lugar. E  então aos sessenta e tantos anos, voltei a voltar. Em tantas águas por debaixo da ponte, lá se foram os meus avós, foi o meu pai,  foi a minha mãe, meus tios, meu padrinho, minha madrinha, e foram tantos decanos daquele meu lugar.  Cacimbas e riachos que secaram. Caminhos que mudaram. Outros que foram e não mais voltaram.

Num pequeno terreno que o meu pai deixou à beira do caminho, naquele meio do mundo e meio do tempo, resolvi construir um sítio florestal, lindo!!!, onde presto homenagem aos meus pais, meu avós, meus padrinhos, meus tios e a tantos outros que se foram, com o título: MEMORIAL DE ANTONIO DE INEZ, hoje  UM PEQUENO SANTUÁRIO DA NATUREZA, aos meus olhos e à minha alma.  E então lá se vão mais de treze que tenho voltado à minha terra natal em SESSENTA E CINCO viagens e muito serviço, ali, à beira da estradinha vicinal, no meio do mato e no meio do mundo. 

E como dizia a minha mãe que “quem gosta de trabalho é trabalhador”, resolvemos, a seguir, em igual situação  em trabalhar a memória do meus avós maternos – DOCA BARROS E JULIANA DE DOCA,  com levantamento de pedra de memória, justo onde foi o seu terreiro e  no monturo de terra onde foi a sua casa. Vejam o futuro que DEUS NOS GUARDA!  No local construímos pequena cobertura denominada VIVENDA TIO PEDRO DE DOCA e uma pracinha circular denominada “solarium – sol e lua” para homenagear o meu tio e padrinho RAIMUNDO DE DOCA  (sendo Pedro e Raimundo, filhos do meu velho avô – DOCA BARROS.

Hoje, o MEMORIAL DE ANTÔNIO DE INEZ  com POESIA AO MEU PAI (que era poeta) e monumento em pedra  modular à MINHA MÃE (que, lavradora de sol a sol, era uma rocha firme na sustentação da família), e os arcos góticos que simbolizam portais em concreto armado, para homenagear os meus avós – DOCA BARROS E JULIANA DE DOCA – são valores que me levam de volta, constante, ao chão das minhas origens. O chão do meu umbigo. O chão dos meus madrigais, ele mesmo da memória dos meus ancestrais. 

Por vezes eu falo com Deus e digo: “Senhor, eu gostaria de ter feito mais cedo o que só agora faço. Também gostaria de ter voltado mais cedo e só agora volto”, quando o sol da minha vida já vai declinando no horizonte. E Ele me responde: “Tudo na vida tem o seu tempo”. E nesse estado de espírito e de alma, é como escrevo esta PÁGINA DE SAUDADE.