OS RASTROS DE RTB – a dona do cabaré

Era uma vez e isto tinha ares de um garimpo. Poeirão lá em cima, gente chegando de todos os lados – pistoleiros, grileiros, operários, aventureiros e muita coisa feita na lambança, no improviso, na gambiarra. A mulherada livre, pra todos os lados: Cacau, Mangueirão, Macaúba, Farra Velha, Quatro Bocas e... nas casas de tábua e outras coletivas de quem se diziam “garotas de programa”. Sexo, pândega, trambiques, grilagem e manobras estava em alta.

É desse tempo que, numa noite de fim de semana, fui chamado para atender a uma ocorrência policial de uma então desconhecida ou pouco conhecida que se chamava (como ainda se chama) RTB. A versão informava que RTB, mulher de vida livre, houvera praticado ato de violência com rastro de sangue na pessoa de uma “colega”, pela disputa ou ciúme de um rufião que se intrujava entre as duas. Na DP dei conta do ofício, “resolvi a parada” e vi RTB sair dali dando-me as costas, ignorando-me plenamente a mim que ali fui o seu benfeitor, ainda que contratado pelo cúmplice, ao que me lembro.

Fiquei chateado, frustrado, sentido. A noite foi “péssima”,  mal-dormida, tudo por causa daquela atitude de indiferença e pouco caso de RTB para comigo que ali, só lhe servi. E cada qual, enfim, para o seu lado. Tantos anos se passaram e volta e meia eu ouvia aquele nome com um sabor amargo, atravessado na garganta. E via à distância que o nome de RTB aos poucos crescia no conchavo da catrevagem da cidade. Vai que um dia... até que um dia... pelas encruzilhadas da vida, RTB sem qualquer menção ou lembrança do passado, volta a me aparecer. Queria a minha intervenção profissional numa pendência em que o seu pai era o foco do caso.

A esse tempo, RTB já era dona de casa de mulheres e nesse ofício era amiga de um juiz que tocava flauta, bebia todas e que se aventurava ao oportunismo nos meios da libertinagem, assim um tanto enrustida. Então a intervenção nos interesses do seu pai ao julgo daquele julgador, foi mão na roda, favas contadas. RTB  em agradecimento me deu um  presente e no contrapeso, entregou-me na bandeja e de mão beijada, uma prima sua, uma fruta madura e gostosa toda pra ninguém botar defeito. Em verdade aquele fruta não era daquele balaio mas... aconteceu! E então, fiquei mais próximo, mais amistoso com a figura. Por vezes ia à sua casa, onde tinha mulheres diversas, marcava presença batia um papo. E era só isso. E mais nada, de nada.

RTB era uma mulher que facilmente se pegava aos seus parceiros e vice versa. Um  certo comandante estrelado, também com atribuições de Delegação, era uma espécie de “autoridade, pra puxar de balde”, como dizia a galera do serviço público. Enrabichou-se com a dita cuja e ela figurava como se fora a “primeira dama” daquele universo do poder. E era!  E então o comandante estrelado e chefe da delegação, comia a sua amada e ainda bebia por conta dela. E nesse jogo maldito cada um tirava o  seu proveito. Até que um dia o estrelado partiu de volta e a festa acabou. Mas RTB, voadora e livre para voar, como sempre, não  perdeu tempo e pouco depois, entrava de mão dadas na igreja  do senhor padre, com o novo parceiro, um tal de FERRABRAZ,  para o escândalo e bate-língua da rádio pião. E RTB nem aí... Algo me diz que essa mulher tem um “quê” que as outra não têm. Será???!!!

E não é que o cara montou pra sua amada, uma “casa noturna”, numa ilha, na beira da praia, no país das maravilhas???!!! E a figura foi viver por cima das tamancas e da carne seca a sua condição de “nova rica”, graças àquele “amor-roxo” que nutria e era correspondida pelo seu FERRABRAZ.  E RTB partiu para a nova aventura deixando aqui em mãos dos outros mas ao seu domínio,  um verdadeiro parque da prostituição; mulheres,  quartos climatizado, serviço de bar sortido e restaurante e tudo enfim.

Tempos depois, ela que tinha o seu castelo na beira da praia, nos braços de FERRABRAZ, um certo dia me telefonou. Sua filha estava com um problema de família “do tamanho de um bonde” e ela pedia a minha intervenção. Ingressei no caso e lutei com unhas e dentes. A moça me conheceu até pouco antes de por a mão no dinheiro. E tal como a mãe no passado, passou a me ignorar. Aí eu tive a confirmação de que “tal mãe, tal filha” ou, como dizia o sertanejo: “casa de mãe, escola de filha”.

Era final de ano, meu irmão, O BRANCO, tava por aqui, então convidei-o para irmos numa chácara apanhar um leitão, do tipo que se assa por inteiro, para as comemorações. No caminho, porém, sem quê nem pra quê, lembrei-me que a gente encostaria na “casa” de RTB só pra “visualizar” o mulherio que tinha por lá. Abre parêntese: Esse “visualizar” é verbo do Roma da TV”. Fecha parêntese.

Aí eu que não sou besta nem nada, fiz as contas e o projeto: “o meu irmão não é de beber, eu também não. A gente toma duas cervejinhas, paga mais umas duas e gasta no máximo (no máximo) dez reais. E lá vamos nós. E engatamos na cervejinha, do tipo 350 ml. Aí vem uma e pede uma dose, vem outra e pede uma dose, outras tantas e pediram outras doses. E eu ali, com cara de zero-800. Sabemos nós que nesse mundo perverso, se você paga doses, você é vem visto, se paga todas e não paga uma aí você não vale nada. E Então, caí no golpe. E quando fui pagar a conta... ... até parece que aquelas doses foram transformadas num caminhão de “cervejinhas”. Quase tenho um piripac! E me prometi que em lanchonete de posto de combustível, em loja de conveniência e em cabaré como o da RTB, nunca mais eu sentaria os pés. Santo remédio! Palavra cumprida!

Semana passada quando eu rodava por uma rua da vida, de repente, vejo três pessoas, de três gerações sucessivas que ali me pareceram avô, filha e neta - carentes e em dificuldades, até para atravessar a rua.  O mais velho caminhava lento, era o pai de uma avô da outra; a mais jovem era a neta e a outra era... era... RTB! Ou, como nos meus tempos de rádio: Esses são os... “Retratos da vida”.