Era final de ano. Festão da entronização dos novatos em clube fechado. Soma-se a isso as festas de fim de ano. Comida e bebida "no balde", na fartura, derramando. Para isso morreram bois, suínos, galináceos. Dinheiro escorreu. E aí já viu: tanta laranja madura, tanto limão pelo chão naquele banquete de ocasião. E eu  lá, naquele meio de mundo do "Parazão", penetra de oportunidade, mas vestido na camisa de convidado. E, como sempre, de olho no social.
Começa a solenidade, quer dizer o banquete. O chefe do clã vestia a camisa de mestre de cerimônia. Pediu silêncio à grande multidão que se espalhava no grande salão que mais parecia um galpão e começou a chamada: "Chamo Fulano de Tal para compor a cabeceira da mesa. Chamo Sicrano de Tal para sentar na cabeceira da mesa. Chamo Beltrano de Tal par compor a cabeceira da mesa. E assim foram chamando tantos e tantos outros sempre "para compor a cabeceira da mesa".
Eu ali, meio que perdido naquela multidão, era como se me perguntasse: "cabeceira de mesa?". Aquilo não me era de ignorar e logo pude imaginar que a "cabeceira de mesa" era lugar de privilégio para os privilegiados; destaque para os destacados; honra para os honrados mas, a bem da verdade, não me era uma palavra, quer dizer uma expressão comum. Ou como no ditério da minha terra: "não era das minhas entregas".
O mundo rodou; tantas voltas rodou e eu hoje mais envelhecido e, quem sabe mais apanhado à razão, me ponho a recordar sobre aquela "cabeceira de mesa", na festa do "Parazão", agora como que numa exclamação: "cabeceira de mesa!" Pois é: cabeceira de mesa! Lugar de destaque para os destacados; privilégio para os privilegiados. Pompa e seda aos que fazem jus. E lá se vou eu, pensando nesse bendito (!) ou maldito (?) lugar...
Pensamentos que vão outros que voam, e lá se vou eu desgarrado e sem lugar à cabeceira da mesa. E quando penso que não, nesse voo do imaginário, caio dentro de um sindicato, de uma associação, de um clube de moradores, de um grupo de classe - desses que não têm na testa o que o periquito roa. Segundo a lenda, ali não corre tostão para quem manda ou representa, mas ninguém quer largar o osso - que é a "cabeceira da mesa". Isso, nunca. E então a cabeceira da mesa tem lá os seus encantos, seu feitiço, suas tentações. Será o mando? O poder? As influências do social? Será o quê?

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O que me move a escrever este tema, justo agora, eleição da nossa OAB? Havia um tempo e SÁLVIO DINO, o cavalheiro de sempre, o conciliador de sempre, esse inveterado arrebanhador de todas as ocasiões, palavra fácil de todos o verbos - reunia-se ali pras bandas do Hotel Anápolis e, por ACLAMAÇÃO, sem disputa e sem bandeira, elegia-se a Diretoria da Subseção da nossa OAB. Uns quatro ou cinco gatos pingados! Novo mandato, nova diretoria e lá estava Sálvio Dino sem brasa e sem sardinha a arrebanhar, novamente pela ACLAMAÇÃO, a nova Diretoria da OAB.
A esse tempo parece até que ninguém estava assim lá tão interessado pela CABECEIRA DA MESA. E aí vinha Geraldo Mariano (in memória), Osvaldo Alencar Rocha (in memória),   Wenner Pereira Lopes (in memória), Clemente Viegas (olha eu!!!),  Aparecido Donizete CAMARGO, Edivaldo Amorim e outros desse mesmo time, sem nenhum açodamento pela CABECEIRA DA MESA. Aliás, era como se fôssemos empurrados a esse podium. Osvaldo Rocha, então presidente, do qual fui secretário, desse guardo memorável lição de democracia; de divisão do "poder" sem nunca-jamais jactanciar-se com a CABECEIRA DA MESA, senão pelo interesse comum e respeito e solidariedade aos profissionais que compõem esse universo.
Hoje, com os novos ventos, dinâmica do sócio-cultural, lógico, os tempos mudaram! E, se no passado uns tantos lutavam e suavam ora por uma sala no Fórum, pela aquisição de uma simples linha telefônica ou um joguinho de sofá, uma máquina de escrever e outras coisas menores e até mesmo pelo chão que hoje serve à imponente e majestosa OAB, agora a CABECEIRA DA MESA  tem outra dimensão; outros posseiros; outros ares; outra visão; outro formato. Outros anseios. Outras metas. E daí o que se vê é um embate, uma cana de braço; um jogo de poder pela disputa do poder. Enfim, pela CABECEIRA DA MESA.
E eu, refratário (rebelde, desobediente, teimoso, obstinado, esquivo e insubmisso) e retardário de todas as ocasiões, logo eu que venho das madrugadas para cavar com unhas e dentes o meu lugar no espaço, vejo essa disputa e lembro da luta dos touros por um harém. Um deles sucumbiu, o outro tomou posse; este que mais tarde sucumbirá para que outro tome posse. São as tentações da CABECEIRA DA MESA.
De uma coisa, porém, me convenço: os próceres que hoje sentam-se a essa bancada não se iludam porque amanhã o feitiço se desfaz e outros que farão a bola da vez ocuparão os lugares à CABECEIRA DA MESA. E aí quando olharem para trás, quem sabe, ou sentirão saudade dessa doce cabeceira de mesa ou nem se ufanarão tanto pelo privilégio de terem sentado à CABECEIRA DA MESA.

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" Viegas é advogado - OAB-MA. Nº 1.018. E questiona o social.